quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

O PEDREIRO AMARILDO, A JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO... E DO BRASIL?





Após uma longa e difícil investigação, amealhada por ameaças contra testemunhas e corrupção ativa e passiva, onde policiais tentaram comprar, também, o silêncio das testemunhas e, por fim, pagaram para algumas pessoas inventarem que o traficante Catatau tinha assassinado Amarildo, esse emblemático caso começa a ter contornos reais. Digo contornos reais, por que até o momento o corpo de Amarildo não foi encontrado.

25 policiais, incluindo o comandante da Unidade Pacificadora da Rocinha, Major Edson Santos, foram indiciadas acusadas de envolvimento no desaparecimento e morte de Amarildo. Quatro policiais já estão presos por decisão da 35ª Vara Criminal da Capital Carioca. São eles: o Tenente Luiz Felipe de Medeiros e os soldados Newland de Oliveira, Silva Junior e Bruno Athanásio. Agora, mais três policiais, incluindo o Major Edson Santos, tiveram sua prisão preventiva decretada após uma auditoria da Justiça Militar. Esse fato foi um avanço nas investigações do desaparecimento do Pedreiro Amarildo, já que existe corporativismo comprovado na Policia Militar do Rio de Janeiro.

No entanto, uma das testemunhas do caso esta desaparecida há mais de 2 meses. Essa testemunha estava, inclusive, no Programa de Proteção a Testemunhas. Como que uma pessoa que está protegida pelo estado e que deveria ter o seu paradeiro sob absoluto sigilo ou a sua identidade preservada, pode desaparecer como fumaça no ar? Quem era o responsável ou os responsáveis pela segurança dessa testemunha? Essas pessoas têm que responder na justiça pela falha ou conivência no desaparecimento da testemunha.

De qualquer forma, desgraças a parte, a justiça do Rio de Janeiro confirmou a pensão para viúva de Amarildo. Dos males o menor? Não! Bom seria que o pedreiro não tivesse sido assassinado de forma tão covarde, como concluiu o inquérito policial e o MP. Ora, quem está sendo acusado de matar Amarildo são os agentes da lei pagos pelo estado para nos proteger de bandidos e assassinos. Está em jogo a credibilidade de uma instituição, pois se fosse somente um policial acusado, dir-se-ia que todos os demais não podem pagar pelo erro de uns poucos. No entanto, são 25 policiais, incluindo um major e um tenente, acusados de um assassinado bárbaro; foi uma unidade policial inteira que participou do sequestro, tortura e morte de cidadão pobre e inocente.

O desaparecimento de Amarildo trouxe a tona um velho problema da Polícia brasileira, herança de muitas ditaduras, coisas que começaram lá na proclamação da república por um militar, Marechal Deodoro da Fonseca, seguido pelo governo da Espada de Floriano Peixoto e terminando em 21 anos de ditadura militar plena que durou de 1964 a 1985. Nesses 21 anos de ditadura militar, alguns setores  da policia brasileira se acostumaram a sequestrar, torturar e matar seus desafetos.

Amarildo foi sequestrado por policiais no dia 14 de julho deste ano. Constatado que ele havia desaparecido, sua família começou uma peregrinação para encontra-lo, sabedora de que os policiais da UPP da Rocinha estavam envolvidos no seu sumiço. Foram para a frente da casa do governador cobrar providências para encontrar Amarildo e sensibilizaram artistas do nível de Caetano Veloso e Wagner Moura. O Caso ganhou repercussão internacional. A investigação passou a correr de forma séria, com o governador sob pressão da mídia e dos órgãos de defesa dos direitos humanos. O Delegado Rivaldo Barbosa entregou, em setembro passado, ao Ministério Público, o Relatório do Inquérito com mais de 180 páginas. Foi a partir daí que os 25 policiais foram indiciados e muitos já estão presos. 


Texto de Pedro Paulo de Oliveira.

Imagem do Major: Alessandro Costa - Agência O Dia.

Imagem de Amarildo: arquivo O Dia.  

  
  






   

O RELATÓRIO DA MENTIRA DA DITADURA MILITAR NO BRASIL.




31 de março de 1964. Uma série de mentiras escandalosas que se espalhariam pelo Brasil como praga. Os militares, defendendo interesses de grupos corporativos e de países como os Estados Unidos e vários outros da Europa, liderados pela Inglaterra, impuseram um vergonhoso sistema de governo aos brasileiros. Dessa farsa participaram homens como Jarbas Passarinho, Olavo Setúbal, Magalhães Pinto, entre outros empresários de peso. A desculpa para o Golpe militar foi de que João Goulart, que havia substituído Jânio quadros estava prestes a se unir com a União Soviética no auge da Guerra Fria. 






Como surgiu a Guerra Fria? Logo após o término da Segunda Guerra Mundial, o mundo foi dividido em dois blocos pelas duas superpotências bélicas que comandaram a derrota dos alemães e japoneses. Essas duas superpotências, Estados Unidos e Rússia, racharam a Alemanha ao meio e impuseram ditaduras, cada uma ao seu modo pelo resto do mundo. Pior de tudo: para impor essas ditaduras, ambas tramavam derrubadas de governos onde seus interesses estavam em jogo e, na maioria das vezes, em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. Como quem está no poder não quer largar o osso, esses governantes, apoiados por um ou outro lado, iniciavam uma carnificina, sendo, inclusive abastecidos belicamente pela potência que os apoiava. Hoje, ainda acontece isso. É o caso da Síria, onde o governo ditatorial tem o expresso apoio da Rússia e os rebeldes são apoiados pelos Estados Unidos e pela França com o intuito de derrubar o ditador. É uma guerra civil injusta e cruel, onde quem mais morre e sofre são os civis, incluindo milhares de crianças. A Guerra Fria nunca acabou.



O parágrafo anterior nos situa no tempo e no espaço com relação aos governos contemporâneos, por que eles existem e permanecem nas suas formas cruéis. Voltando ao Brasil e ao seu período mais negro, vemos os militares defendendo, de 1964 a 1985, os interesses de multinacionais, bancos privados, e setores retrógrados do campo. A Igreja Católica, nesse período, se dividiu entre o bem e o mal, uma parte apoiando os militares e outra parte defendendo os perseguidos pela ditadura. Logo no início do Golpe Militar, setores avançados da sociedade se posicionaram contra o golpe e o regime reinante inciou a caça às bruxas com muitos trabalhadores, intelectuais e estudantes sendo tachados de comunistas. Foram editados atos institucionais com poder de lei máxima. Direitos civis foram cassados e o pior dos atos foi o de número 5 que fechou o congresso, prendeu e exilou parlamentares, artistas e intelectuais, além de, sob a sua égide, os órgãos de segurança do governo prenderam, torturaram e mataram muitos brasileiros.




Como foi dito, parte da Igreja Católica foi conivente com o golpe; muitos empresários, intelectuais e políticos não só apoiaram o Golpe Militar, mas se beneficiaram dele, se enriquecendo às suas custas. Só para citar três exemplos de descalabros durante a ditadura militar, basta nos lembrarmos das construções da Transamazônica, da Ferrovia do Aço e da usina de Itaipu. Essas três obras quebraram o país e não deram em nada. Hoje, a Transamazônica é um problema sem solução, feito de lama e buracos; a Ferrovia do Aço virou MRS, entregue, de graça, para a Iniciativa privada; e a Usina de Itaipu gera mais lucro para o Paraguai do que para o Brasil.

Por conta de 21 anos de governo feito à base do fuzil, dos tanques urutus e de mentiras, tal como o milagre brasileiro, que teve o seu auge na década de 70 com a seleção canarinho, muitos brasileiros desapareceram nos porões do Departamento de Ordem Política e Social – DOPS, principalmente sob a covardia do delegado Sérgio Freury em São Paulo. 




Com a sua sanha e o seu poder, a ditadura Militar criou heróis à esquerda, entre eles Carlos Marighella, Carlos Lamarca e Vladimir Herzog. Esses homens lutaram pela liberdade do seu povo e pela independência do Brasil nesse período negro. Perderam suas vidas de forma cruel e covarde. Além deles, outros milhares de brasileiros sucumbiram defendendo o Brasil.

Aos trancos e barrancos, depois de mais de 20 anos de queda da ditadura militar, surgiu a Comissão da Verdade, com o intuito de esclarecer os crimes cometidos durante o regime imposto pelos militares. Até o momento, muitas vítimas foram indenizadas e nomes de torturadores foram divulgados. O caso mais recente e emblemático está no relatório que mostrou o que todo historiador chinfrim já sabia: que o General Artur da Costa e Silva, que governou nosso país de 1966 a 1969 e foi o autor do Ato Institucional de número 5, entrou para a história como um dos maiores carrascos da ditadura militar. Com a divulgação desse relatório, o Prefeito de Taquari – RS, cidade natal do famigerado general, mandou derrubar uma estátua em sua homenagem que estava na principal praça da cidade desde o ano de 1976.

A Comissão da Verdade, criada por lei e mantida à custa dos cofres públicos, tem feito seu trabalho como pode. Como pode, tendo em vista que vai apontar muitos carrascos e ninguém será punido. Os militares sequer aceitam abrir todos os arquivos da ditadura e muitos nomes citados estão sob a proteção da lei que proíbe que eles sejam punidos. No entanto, uma investigação histórica deveria se munir de forças capazes de desvendar profundamente os fatos. Quando autores de acontecimentos detêm poder para mascarar e esconder dados, invalidam e colocam sob suspeita as conclusões dos investigadores.



Não há luzes nas investigações da Comissão da Verdade, já que ela tem restrições para investigar e concluir suas investigações. Como mostrar ao Brasil que houve atrocidades praticadas por militares, como os generais presidentes, e por civis, como os delegados comandantes do DOPS, se dados, nomes e fatos são ocultados? Essa Comissão, com toda a expectativa criada durante a sua formação, está desacreditada. Ou ela tem poder para mostrar toda a verdade histórica ou se desmancha toda a estrutura montada para mostrar meias verdades ou o que todo mundo já sabia: que os militares, por mais de 20 anos, perseguiram, torturam e mataram centenas de inocentes no Brasil. 

 Do jeito que está, parece que o Coronel Telhada e o Lobão têm razão.

Dizem que não existe meias verdades. Mas, meias mentiras, eu tenho certeza que existem.



Texto de Pedro Paulo de Oliveira.

            Imagens: Estadão.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

O DIREITO DE SE FAZER MORRER


 

Terei eu o direito de morrer? Não penso que se possa conceber a negação deste direito a quem quer que seja. Mas, apesar de parecer óbvio o direito de morte, o tema é cercado de tal forma que o direito de morrer não é algo tão pacífico como parece. Quero dizer, se tenho o direito de morrer, tenho, pois, o direito de providenciar a minha própria morte? Não, não o tenho. Ainda que eu não seja punido pela providência, não o tenho, pelo menos segundo a legislação brasileira.





Certos princípios e institutos são considerados fundamentais à possibilidade de existência digna do indivíduo na nossa sociedade. São os chamados direitos da personalidade. São direitos da ordem privada. Tais direitos estão previstos no artigo da Constituição Federal e nos artigos 11 a 21 do Código Civil.

Sobre eu poder dar cabo da minha vida? Algo está previsto? Pode parecer que não, mas, sim, absurdamente, há previsão legal a respeito do assunto, e a previsão é em detrimento da minha liberdade de decidir. Código Civil, Capítulo II, Artigo 13: “Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.”

Isso, de contrariar os “bons costumes”, é a margem de manobra entregue à moralidade dominante. Conforme o poder estabelecido, ao talante da formatação ideológica do juiz, os “bons costumes” serão mais ou menos vinculados à mentalidade conservadora. Já a “disposição do próprio corpo” é uma expressão mais objetivável. Portando, pelo menos considerando essa disposição do Código Civil, eu dar cabo da vida do meu corpo importa em diminuir permanentemente a minha integridade física.

A vedação é civil e não há uma pena prevista para o caso de eu subtrair de mim a minha vida. O Código Penal silencia sobre o tema. O suicídio (mesmo na modalidade tentativa) não é um ilícito penal. Contudo, se eu quiser morrer, tenho que me virar por própria conta. Não posso pedir auxílio. Se alguém me ajudar, será alcançado pelo artigo 122 do Código Penal. É crime o induzimento, a instigação ou a assistência ao suicídio. É ilícito acoroçoar a vontade, implantá-la ou colaborar com ela materialmente.
Mas, ora, pode ser dito: se eu desejar morrer, basta eu dar jeito nisso e tudo estará resolvido. Mais ou menos. Fazer-se morrer, em havendo deliberação resolvida de foro íntimo, exige condição física para tanto e um saber fazer, sobretudo se eu desejar fazer-me morrer de forma digna, agasalhada por meios que não me façam padecer fisicamente ou moralmente.

Meu cachorro envelheceu e foi tomado por dores na coluna lombar e nas pernas traseiras. Já não conseguia levantar-se nem para comer. Fui à veterinária pedir socorro em nome da dignidade canina. Ela o fez morrer. Alguém dirá que não somos cães, somos um animal superior. Na ordem da natureza, isso é irrelevante. Mas, como somos cultura e decidimos culturalmente que somos superiores, então, de fato, o somos. Mas, estranhamente, não obstante a superioridade em que nos declaramos, não nos emprestamos uma condição digna de executar a própria morte.

A humanidade inventou valores e os insculpiu em normas. As normas formam um patamar de vida com decência. O Direito declara certas garantias, dignificando a condição de existência humana. Aliás, o Direito já declara e exige até mesmo o tratamento respeitoso aos demais animais que coabitam o nosso mundo. Os valores mais elevados, nós os temos insculpidos na Carta Constitucional. O inciso III do artigo da Constituição prevê que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”.

Não obstante a vida ser o valor sem o qual os demais inexistem, muitas vezes as nossas circunstâncias concretas nos deterioram o viver. Em certas situações, nossa vida torna-se degradada. Defendo que se a vida mesma me degrada a existência, eu posso dar fim nela, dando fim a mim. E advogo que tal deve ser feito com a ajuda do saber adequado, que o é o saber médico. Não há qualquer sentido jurídico considerar a eutanásia um homicídio. Homicídio é matar alguém contra a sua vontade. Eutanásia é acudir um humano em seu pedido de morrer com humanidade.


Doutor e Mestre em Direito pela UFSC. Especialista em Administração de Empresas e em Economia. Professor da Unisul. Advogado, Psicólogo e Jornalista.

NAYRA E O CHAVELHO DE ESPINHOS NA FAIXA DE GAZA

" Esses pequeninos, cheios de sonhos, sonhos que embalam o mundo, distantes das       ambições e da crueldade dos homens e mulheres que...