Um tema polêmico, mas que precisa ser discutido. Seria, nos dias atuais, verdadeiramente estupro a conjunção carnal consentida e consciente entre um jovem de 18 anos e uma garota de 14 anos? As garotas, hoje em dia, assim como os garotos, estão cada vez mais - e conscientes - se iniciando sexualmente, muito cedo. As razões para essa inicialização, que pode parecer precoce, estão nas telenovelas, nas mensagens das músicas, nas propagandas com apelos sexuais e nos programas semanais, tendo como exemplo maior o Pânico na Band.
De JUSBRASIL - Por Danielli Xavier Freitas, recorte do seu estudo sobre o tema:
"Sociólogos registram, neste período, a maior instabilidade e
psicologização das relações conjugais; o enfraquecimento do controle
parental, escolar e do grupo de pares sobre a sexualidade adolescente,
que têm levado ao amadurecimento sexual mais precoce dos jovens. Além
disso, o progresso das técnicas anticoncepcionais, principalmente as
pílulas de controle da natalidade, vêm libertando as mulheres das
inquietações e temores da gravidez indesejada. (Shecaira, 2010).
Que a definição do patamar etário para a caracterização da
vulnerabilidade é baseada numa ficção jurídica, que nem sempre
encontrará respaldo na realidade do caso concreto, notadamente quando se
leva em consideração o acentuado desenvolvimento dos meios de
comunicação e a propagação de informações, que aceleram o
desenvolvimento intelectual e capacidade cognitiva das crianças e
adolescentes.
Com a devida vênia discorda Luiz Regis Prado (2010: p. 624) ao descrever:
Configura o delito em análise a conduta de ter conjunção carnal ou praticar qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 (catorze) anos, ainda que a vítima tenha consentido no ato, pois a lei ao adotar o critério cronológico acaba por presumir iuris et de iuris, pela razão biológica da idade, que o menor carece de capacidade e discernimento para compreender o significado do ato sexual. Daí negar-se existência válida a seu consentimento, não tendo ele qualquer relevância jurídica para fins de tipificação do delito".
Reproduzimos, ainda, abaixo, as considerações sobre o tema de um delegado de polícia do Estado de Minas Gerais:
A presunção de violência prevista
no crime do artigo 217-A do Código Penal (ter conjunção carnal ou
praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos) não deve
ser interpretada como absoluta, devendo o consentimento do menor ter
importância significativa.
Aludido fato merece investigação
e interpretação aprofundada, objetivando aferir se o menor é realmente pessoa
vulnerável. Pessoa vulnerável é aquela que não pode oferecer resistência ou
incapaz de discernir sobre a prática de atos sexuais.
Nos dias de hoje, impossível crer
que um adolescente com menos 14 anos de idade não tenha discernimento
sobre sua vontade sexual. Somente deverão ser considerados vulneráveis aqueles
que comprovadamente incapazes de compreender a natureza dos atos sexuais, ou
que, por qualquer outro motivo, não possam oferecer resistência. A finalidade
da legislação é dar proteção a quem dela precisa, e não tolher a vontade sexual
do ser humano.
Se considerarmos que todo
adolescente menor de 14 anos de idade é vulnerável, presumindo a violência
absoluta, estaremos diante de uma aberração sem balizas, pois todos aqueles
garotos menores de idade que namorassem menores com menos de 14 anos, mesmo com
o consentimento de seus pais, teriam de ser apreendidos e punidos porque
infratores.
Por esta razão, é que a
Autoridade Policial ao se deparar com a notícia de que um menor de 14 anos foi
“abusado” sexualmente, deve ter muita cautela na decisão de lavrar ou não o
auto de prisão em flagrante. Deve levar em conta seu consentimento e capacidade
de entendimento para exercer livremente sua sexualidade, até porque, se tem
percepção, não precisará da proteção da lei. Havendo dúvidas, a instauração de
inquérito policial por portaria será a providência mais adequada.
É certo que para muitos a
maioridade de um investigado pode acoimar a conduta de imoral, mas para os
aplicadores do direito cabe tão somente avaliá-la perante o direito.
Tanto assim, que muitos dos
supostos estupradores, não obstante condenados em primeiro grau, estão sendo
absolvidos pelos Tribunais de Justiça, vez que não entendida a violência
presumida de forma absoluta.
À bem da verdade, é que os
conceitos de sexualidade evoluíram significativamente, sendo ingênuo acreditar
na ausência de ciência dos adolescentes sobre o tema nos dias atuais. A
legislação deve ser aplicada com a finalidade de proteção da vontade sexual e
nunca de oprimi-la.
Carlos Benedetti Lopes
Delegado de Polícia do Estado de Minas Gerais.