Mais uma vez o PMDB vai assumir o governo em meio ao mar de lama que assola o Brasil; mais uma vez o maior partido político deste país vai governar o país sem ter ganhado a eleição presidencial ou ter legitimidade para assumir a chefia do Poder Executivo em esfera federal.
Michel Temer assumindo a Presidência da República irá, com toda certeza, ser o pivô do terceiro golpe de estado perpetrado pelo PMDB. Relembremos: quando Tancredo Neves misteriosamente morreu quem assumiu a chefia da nação foi José Sarney do PMDB (e desgraçou o país, entregando-o ao seu sucessor em petição de miséria); quando Fernando Color foi cassado, quem entrou no seu lugar foi Itamar Franco, do PMDB (figura icônica e que governou segundo seus critérios); agora, é a vez de Michel Temer assumir no 3º golpe depois do fim da Ditadura Militar.
Transcrevo abaixo, o texto do Jurista Luiz Flávio Gomes que ilustra com clareza como está se dando esse golpe e quem está blindado politicamente com a queda da Presidente Dilma.
TEXTO DO JURISTA LUIZ FLÁVIO GOMES
Temer presidente e a corrupção: sua proteção constitucional. Como se livrar de Cunha? Qual será o ritmo da Lava Jato?
STF rejeita recursos pró-Dilma. “Rei morto, rei posto”. O poder é
assim: um nem acabou de sair (só um milagre pode salvar Dilma do
impeachment), o outro já está “tomando posse”, constituindo ministério e
anunciando programa de governo. Não há vacância no poder. A tudo isso
as castas oligarcas (políticas, econômicas e corporativas),
completamente carcomidas pela corrupção e pelo patrimonialismo, estão
acostumadas. Elas movem as peças do jogo do poder conforme suas
conveniências. O único detalhe diferente desde 2014, que está fora do
controle delas, é a Lava Jato que, em qualquer momento, pode mudar tudo.
No
seu famigerado vídeo “vazado” de 14 minutos, Temer não toca no tema da
corrupção. Nem vai fazê-lo espontaneamente durante seu período
presidencial. Temer não pode incomodar nem assustar seus
correligionários. Ao contrário, na medida do possível, deve funcionar a
velha solidariedade dentro das castas.
No
PMDB nacional o assunto corrupção é proibido, em razão (1) das
implicações pessoais do próprio Temer (medidas provisórias “compradas”
em benefício dos seus financiadores, por exemplo), (2) da campanha
eleitoral Dilma-Temer de 2014, reconhecidamente criminosa e objeto de
várias delações premiadas (a do Delcídio e da Andrade Gutierrez, por
exemplo) e (3) da “extensa folha corrida” das castas oligarcas que o
estão apoiando (Cunha, Renan, Jucá, Jader, Raupp, Sarney, Maluf, Partido
Progressista, Paulinho da Força, Roberto Jefferson etc.). Todos juntos,
na foto da posse, vai transmitir a sensação de 500 anos de prisão!
O
PMDB, nos seus 50 anos de existência, como uma grande federalização de
interesses privados, tornou-se o artífice-mor do Estado patrimonialista
(toma lá dá cá), onde a confusão entre o público e o privado (pelo
agente do Estado) ou entre o privado e o público (pelo agente do
Mercado) é intensa e diária. Falar de corrupção na cúpula do PMDB é o
quarto impossível de Freud (os outros são: governar, educar e
psicanalisar). Aliás, não se fala em corda em casa de enforcado.
Temer
pode surpreender com boas medidas e até causar boa impressão imediata,
porque dele ninguém (ressalvadas as castas apoiadoras) espera nada
mesmo. De qualquer modo, supor que, com o PMDB no poder, as castas
oligarcas dos setores empresariais, corporativos e financeiros deixem de
mamar nas tetas do governo (BNDES, Bancos Públicos, isenções fiscais
etc.) já é pedir demais. Continuaremos com o Estado patrimonialista
(toma lá dá cá), com o capitalismo de Estado (sua participação direta ou
indireta no lado produtivo da economia) assim como com o capitalismo de
compadrio (dos carteis, de laços, como diz S. Lazzarini). Tudo deve
mudar para que tudo fique como está.
Proteção constitucional
Se
Michel Temer assumir a presidência da República, não pode ser
processado (há quem entenda absurdamente que não poderia nem sequer ser
investigado) por crimes cometidos fora ou antes da função. Seu nome já
apareceu várias vezes na Lava Jato ou fora dela. Mas por crimes
anteriores à função ele não pode ser processado. Impunidade momentânea
como privilégio do cargo.
Ficaremos sem saber, por algum tempo,
se Temer efetivamente participou (ou não) da organização criminosa na
Petrobras. Que seu partido (PMDB) foi beneficiário de propinas ninguém
duvida (os ex-diretores da empresa confirmaram isso). Que essas propinas
se converteram em “doações legais” já se suspeita fortemente (delações
da Andrade Gutierrez, por exemplo, ou de Ricardo Pessoa). Alguns
ex-diretores (pivôs das propinas) teriam sido indicados por ele[1].
Tudo isso vai para o túmulo, por um período. Ficará na obscuridade
também o fato de ter ajudado a editar uma medida provisória para
beneficiar o Grupo Libra, seu financiador.
Há uma divergência
entre Janot (que entende que o presidente em exercício não pode sequer
ser investigado) e Teori (este se posiciona no sentido de que investigar
pode). A segunda corrente é a mais acertada (porque é fundamental que
as provas sejam colhidas e preservadas, antes evidentemente do seu
desaparecimento). Se acolhida a 2ª tese, Temer seria, pelo menos,
investigado. Por fatos cometidos no exercício da função ele pode ser
investigado e processado.
Tentativa de escapar da cassação do TSE
O
TSE, por sua jurisprudência tradicional, havendo razões e provas,
sempre promove a cassação da chapa. Separar Dilma de Temer será um
rematado golpe contra o Estado de Direito. As contas são separadas por
partido, mas os vícios na camapnha eleitoral de Dilma afetam a chapa
inteira. De duas maneiras Temer será atingido: (a) se houve crime ou
abuso na campanha de Dilma; (b) se houve crime ou abuso na sua própria
campanha.
As delações que já existem e as que se avizinham (mesmo
sem contar ainda com as da Odebrecht) abalam profundamente a lisura da
campanha eleitoral de 2014. Houve abuso de poder político e econômico.
A
campanha Dilma-Temer está corroída pela corrupção (envolvendo,
sobretudo, as empreiteiras). A Pepper prestou serviços para a campanha e
recebeu dinheiro por fora (da Oaz, da Queiroz Galvão etc.). Institutos
de pesquisa receberam dinheiro por fora. Isso se chama caixa 3. A Egesa
“quitou papagaios” das campanhas eleitorais. O dono da UTC, Ricardo
Pessoa, em 2015, já havia implicado a chapa Dilma-Temer em sua
colaboração premiada.
As doações da Andrade Gutierrez se
dividiram generosamente entre o PT e o PMDB e a principal sigla
oposicionista, o PSDB. Segundo o TSE, o PT recebeu em doações da Andrade
Gutierrez dentro e fora do período eleitoral, em 2014, cerca de R$ 35,6
milhões. Para a legenda tucana, foram R$ 41 milhões, incluindo
colaborações para a campanha e as destinadas ao Diretório antes do
início do período eleitoral. O PMDB recebeu um total de R$ 35,4 milhões,
segundo o TSE (ver Folha).
“Reputou-se comprovado o
direcionamento de propinas acertadas no esquema criminoso da Petrobras
para doações eleitorais registradas”, afirmou o juiz titular da
Lava-Jato em Curitiba, Sergio Moro, ao remeter ao TSE, em outubro de
2015, informações sobre as investigações e processos que tramitam na
primeira instância da Justiça Federal do Paraná.
Moro se referia
na ocasião aos delatores Alberto Youssef (doleiro), Paulo Roberto Costa
(ex-diretor de Abastecimento da Petrobras), Pedro Barusco (ex-gerente da
petrolífera), Augusto Mendonça Neto (empresário do Grupo Setal), Milton
Pascowitch (lobista) e Ricardo Pessoa. De acordo com Moro, eles
“declararam que parte dos recursos acertados no esquema criminoso da
Petrobras eram destinados a doações eleitorais registradas e não
registradas” (Folha). Parte das propinas foram para o PT e parte
para o PMDB (os dois, ao lado do PP, eram os sócios majoritários desse
crime organizado).
Nas obras civis da usina de Belo Monte foram
contratadas por R$ 14,5 bilhões, dos quais 1% teria sido destinado a
propinas para políticos do PT e do PMDB, segundo a versão de executivos
da Andrade. O valor do suborno, de acordo com essa versão, foi de R$ 140
milhões. Também houve corrupção no Complexo Petroquímico do RJ.
Os
depoimentos dos executivos da Gutierrez (que devem ser provados, para
ter validade jurídica) atingem frontalmente as campanhas eleitorais de
Dilma Rousseff e Michel Temer (PMDB), em 2010 e em 2014.
Os
executivos da construtora relatam que as “doações eleitorais” aos
partidos ajudados decorriam de propinas das obras realizadas. Isso
significa lavagem de dinheiro, ou seja, campanhas criminosas inclusive
“dentro da lei”. As “doações”, embora tivessem uma aparência de
legalidade, visavam à obtenção de vantagens indevidas nas licitações. É
preciso acelerar o julgamento no TSE, porque o crime está na base também
na eleição de 2014.
A chapa Dilma-Temer deve ser cassada não
apenas pelos crimes que ocorreram “dentro da lei” (lavagem de dinheiro).
Muitos foram praticados “por fora”, em caixa 2 e caixa 3 (caso da
Pepper, por exemplo). As contas dos partidos junto ao TSE são separadas,
mas a responsabilidade pela campanha criminosa não. Neste ano as
campanhas não terão dinheiro de empresas. Muitos afirmar que haverá
grande quantidade de caixa 2 e 3. Se o TSE não der o exemplo, cassando a
chapa Dilma-Temer, todos vão se sentir encorajados a praticar crimes
eleitorais.
Como se livrar do Cunha?
As
castas poderosas que estão lutando pela posse de Temer até estariam
dispostas a fechar os olhos para seus “problemas pessoais e partidários”
(criminalidade das suas campanhas e financiamentos). Mesmo com perfil
tenebroso, nem elas suportam a ideia de que Cunha possa assumir a
Presidência da República nas ausências de Temer (e que a Claudia Cruz,
com vestimentas de Paris, seja a 1ª dama por algumas horas). Isso
assusta o mundo inteiro, sobretudo o investidor.
Mais: as classes
médias sempre foram intolerantes com os que chegam no nível de
“estupradores da moral”. Extratos bancários de contas secretas
alimentadas por propinas é mais ou menos como sexo explícito ao meio dia
nas ruas das cidades.
Para a prosperidade do “País”, que
pressupõe confiança no governo Temer, será preciso manter as aparências e
tirar Cunha prontamente da presidência da Câmara (eventual “acordão”
pode até preservar o seu mandato, afinal estamos falando do mundo
político brasileiro, que não tem bom histórico). O caminho será
incentivar o STF a fazer isso o mais rápido possível. Uma boa campanha
da mídia grande, depois do impeachment, pode se encarregar da “limpeza”.
A mídia, como sabemos, tem poder para pautar os tribunais. Mais um
escândalo envolvendo outro extrato bancário e mais uma bolsa “louis
vuitton” do casal, e tudo estará resolvido.
O que fazer com companheiros pegos pela Lava Jato?
Nada
seguramente será explícito. Mas o Presidente da República, se quiser,
pode participar da Operação Abafa Tudo (a) apoiando novas leis de
anistia ou favoráveis aos réus (na linha do que já aconteceu com a lei
da repatriação e medida provisória 703),
(b) mudando o superintendente da polícia federal, (c) cortando os meios
materiais de atuação da polícia, do MPF e da Justiça, (d) estimulando
campanhas difamatórias dos investigadores e juízes; (e) desentusiasmando
a mídia, o que gera (f) o desestímulo do apoio popular etc. Mas tudo
isso pressupõe um governo Temer estável. Da estabilidade ou
instabilidade do seu governo muitas consequências são extraídas. Se a
Lava Jato prosseguir em seu ritmo, ela constitui fonte de instabilidade
permanente. Vejamos.
- CAROS internautas que queiram nos honrar com a leitura deste artigo: sou do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE) e recrimino todos os políticos comprovadamente desonestos assim como sou radicalmente contra a corrupção cleptocrata de todos os agentes públicos (mancomunados com agentes privados) que já governaram ou que governam o País, roubando o dinheiro público. Todos os partidos e agentes inequivocamente envolvidos com a corrupção (PT, PMDB, PSDB, PP, PTB, DEM, Solidariedade, PSB etc.), além de ladrões, foram ou são fisiológicos (toma lá dá cá) e ultraconservadores não do bem, sim, dos interesses das oligarquias bem posicionadas dentro da sociedade e do Estado. Mais: fraudam a confiança dos tolos que cegamente confiam em corruptos e ainda imoralmente os defendem.
[1] Ver http://www.valor.com.br/política/4517902/na-presidencia-da-republica-michel-temer-pode-escapar-de-lava-jato, consultado em 11/4/16.
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