segunda-feira, 28 de outubro de 2013

A MORTE BRUTAL DE UM INOCENTE DE 17 ANOS. UMA DISCUSSÃO SOBRE O DIREITO À VIDA.





O corporativismo existe em muitas profissões e, até certo ponto, é normal, desde que não ultrapasse certos limites e prejudique a população. No entanto, diante de muitos e recentes acontecimentos, seria interessante uma discussão mais apurada sobre o corporativismo policial. Claro que criticar policiais neste país ou em qualquer outro lugar do mundo sempre foi muito complicado e perigoso. Normalmente, em todas as ações que esses agentes da lei praticam, existe, entre eles, o corporativismo. O corporativismo no meio policial, seja militar ou civil é, inclusive, duro. O policial delator de colega é colocado em desgraça eterna. A grande maioria dos policiais, logo que veste suas fardas e coloca suas armas na cintura, é acometida por uma sensação de poder, impunidade e prepotência. É comum ver policiais agindo de forma truculenta em situações onde bastariam suas presenças para coibir ações de pessoas ou grupos de marginais, e onde inocentes estão no meio.

Infelizmente, a nossa população honesta, trabalhadora, formada por homens e mulheres das classes médias baixas, tem medo da polícia, tal como tem medo dos bandidos. O medo se equivale. Isso não é normal. O normal seria que as pessoas tivessem os policiais como amigos e que, ao vê-los, não temessem ser abordadas de forma truculenta e mortas por um tiro.

Ora, a palavra polícia, que deriva de polis, que por sua vez significa cidade, deveria nos encher de orgulho, tornar-nos cidadãos melhores, mais proativos e servir-nos de exemplo de dignidade. Mas não é o que vem acontecendo, em extensão alarmante, em cidades como o Rio de Janeiro, São Paulo, Vitória, Salvador e várias outras capitais, incluindo Belo Horizonte, em menor escala. Quando cito Belo Horizonte em menor escala, não é porque seja essa cidade a capital do estado de onde é escrito este texto, mas por que a Polícia Militar mineira, ao longo da sua história, tem sido mais contundente contra as faltas dos membros da sua corporação. Ela nem está isenta de faltas dos seus membros e existem vários policiais presos em batalhões e outros expulsos por crimes diversos.


No entanto, a discussão que se inicia no momento coloca, em especial, as Polícias Militar do estado de São Paulo e do Rio de Janeiro em xeque. Há anos essas corporações vêm sendo alvo de denúncias graves de abusos de autoridade, assassinatos, torturas, corrupção, tráfico, formação de quadrilhas e sequestros. Com certeza esses grupos armados, fardados, com distintivos e em carros oficiais, não representam a maioria das corporações. Mas, conseguem criar uma imagem de terror emanando da maioria dos policiais.


A MORTE DE DOUGLAS


Vamos ao fato que está indignando o povo simples e trabalhador de São Paulo (não percebo indignação em nenhum grande empresário que anda de helicóptero ou político que anda de avião):

Douglas é um garoto e 17 anos, de estatura mediana, moreno e esguio. Fenótipo típico de um jovem brasileiro, morador de periferia, mistura de raças. Ele mora na Vila Medeiros, periferia de São Paulo e está cursando o 3º ano do ensino médio. Gosta de trabalhar, mesmo ainda não tendo maioridade e faz “bicos” numa lanchonete do bairro. Ele está feliz, sonha grande e, com o dinheiro que recebeu, recentemente do seguro desemprego, comprou seu primeiro carro, um Volkswagen Gol. Não é lá um carro novinho. Mas, está em bom estado e vai ficar guardado até ele completar 18 anos e tirar sua carteira de habilitação.

É domingo, dia 27 de outubro, Douglas levanta tarde e, depois do almoço, convida seu irmão mais novo para saírem. Seu irmão está entrando na adolescência e já completou 13 anos. Douglas ficou sabendo que haveria um campeonato de pipa em Atibaia e queria participar. Essa é a paixão dele. Os dois saem pela rua, encontram um amigo e vão conversando sobre o campeonato de pipa, cada um expondo seu ponto de vista e as manobras que Douglas poderia fazer nas disputas. Os três chegam ao Bairro Jardim, na Rua Bacurizinho, onde mora o amigo de Douglas. Nesse ponto, eles param para que o amigo avise seu pai que eles pretendem ir até Atibaia. O amigo se afasta e os dois irmãos ficam em frente a um bar aguardando-o.

A Polícia Militar recebe uma reclamação de que no Bairro Jardim, nas proximidades da Rua Bacurizinho, esquina com a Rua Mendes da Rocha, um carro está tocando funk com o som elevado. Uma viatura que está nas proximidades é acionada para fazer a verificação dos fatos e, se comprovado, fazer valer a lei do sossego. O policial Luciano Pinheiro Bispo está no banco do carona e saca sua pistola Ponto 40 e a engatilha. A viatura sai em alta velocidade com o giroflex ligado. Em poucos instantes os policiais entram na Rua Bacurizinho. Eles observam os garotos, o bar aberto, o resto da movimentação. O motorista dá a volta na rua e a viatura passa paralela a Douglas que olha distraidamente para os policiais no seu interior. Luciano Bispo, com a arma em punho, engatilhada e com o dedo no gatilho, sente um tranco na sua mão. Um tiro foi disparado da sua arma. Ele olha para a rua e vê Douglas, que lhe pergunta, quase numa súplica:

---- Por que o senhor fez isso comigo?

O Policial Luciano Bispo olha para os colegas e todos descem da viatura. Aproximam-se de Douglas que, sem forças, dobra os joelhos com o peito atravessado por uma bala ponto 40.

Um pouco afastado, um garoto de 13 anos olha a cena sem poder acreditar no que está acontecendo. Pensa que tudo não passa de um pesadelo. Olha em volta e não pode fazer nada. Vê seu irmão tombando sem vida e precisa ficar em silêncio. Está aterrorizado, sem fala, temendo pela própria vida e pensa que, se fizer alguma coisa, um movimento suspeito, também será morto. Olha para o amigo ao lado do pai e percebe, nos olhos de cada um deles, o mesmo horror.

Douglas olha para o irmão, fecha os olhos, pensa no seu pai, pensa na sua família, pensa no seu carro. Seus pensamentos se apagam; terminam seus sonhos; encerra-se a sua vida que poderia ser longa, cheia de vitórias e muitos amigos.

em Atibaia, as pipas cortam o céu azul.




CONCLUSÃO:

O Policial Luciano Bispo foi preso em fragrante, autuado por crime culposo (quando se mata sem intenção). Sem querer discutir os méritos da atuação de quem indiciou esse policial, méritos, talvez, jurídicos, não tem graça essa forma de prisão. Se não, vejamos: será que o Policial Luciano Bispo não sabia que poderia matar uma pessoa com a arma engatilhada e mirando para ela? Claro que sabia. A partir do momento em que ele empunhou a arma, engatilhou-a e mirou na direção do garoto Douglas, assumiu, conscientemente, o risco de matar. Da forma como ele agiu, tinha, sim, a intenção de matar. Ninguém empunha, engatilha e mira uma arma para alguém sem a intenção de matar.

O cidadão Douglas deveria ser protegido pela policia e nãos ser assassinado por ela. Ele, como qualquer outro cidadão, queria e deveria ter orgulho da sua “polis”, respeitar os agentes da lei e, acima de tudo, ser livre para ir e vir.

Douglas está morto. Nada no mundo vai mudar esse fato. No entanto, que a sua morte sirva para mostrar à polícia de São Paulo onde estão os seus erros e a sua banda podre. Talvez, um dia, os bons policiais – e existem muitos – possam se impor e sejam exemplos a serem seguidos, não incutindo medo aos cidadãos de bem.



O que a população de bem pede é muito pouco. Pede, apenas, que os governantes, que governam para ela, mantido com o dinheiro dos impostos descontado dela, tenham um mínimo de decência e lhes dê, além de outros direitos básicos, o direito à vida.



Texto de Pedro Paulo de Oliveira.

Imagens: bcuia.org

sábado, 26 de outubro de 2013

BRASIL, UMA NAÇÃO SEM LEI – UMA JUVENTUDE PERDIDA




O normal seria indignar-nos diante da guerra, dos assassinatos, da falta de segurança para andarmos livres pelas ruas. Normal, com certeza, é poder sair de casa numa segunda-feira para trabalhar e transitar pelas ruas, seja em nossos veículos, a pé ou através de transporte público, de forma livre, segura e permanente. Mas não é o que tem ocorrido no Brasil. O cidadão comum, trabalhador de classe baixa ou média, morador das capitais ou qualquer cidade grande, ao sair de casa pela manhã para trabalhar ou usufruir do seu lazer, não sabe se voltará no final do dia. Essa é a nossa dura realidade. A explicação está em que uma pequena parcela dos nossos jovens está contaminada pelo delírio das drogas e, diante da inoperância das nossas autoridades, sejam governamentais, judiciais ou policiais, arma-se de revólveres, roubam motos e saem praticando assaltos, desesperados por dinheiro para comprar drogas dos traficantes e “curtir” nos bares e bailes das periferias.

Nas periferias, sejam favelas ou bairros mais afastados existem grupos que comandam temporariamente o crime. São os donos das bocas de fumo, organizadores de bailes funk, milicianos, donos de desmanches e cafetões. Como o que move o mundo é o dinheiro e o poder que ele carrega consigo, nesses rincões não é diferente. Sem dinheiro, não se é nada. Assim, muitos jovens, seduzidos pelo brilho das drogas e dos bailes funk, conseguem armas calibre 32 e 38, em desuso pelos chefes das organizações criminosas, e saem desesperados para os centros das cidades praticando assaltos indiscriminados. Como estão dispostos a tudo para conseguir dinheiro, entram nos comércios de forma violenta, fazem arrastões nos trânsitos, invadem casas e matam quando se sentem ameaçados ou feridos no seu orgulho.

Um dos sentimentos experimentados por esses jovens, segundo ouvi de um deles que esteve preso por 5 anos, é o de que, com a arma em punho, eles se sentem poderosos. No instante que eles escolhem suas vítimas, eles a olham com desprezo e sente nojo dela pelo fato dela estar acima deles socialmente. Assim, durante muitas abordagens, esses jovens matam apenas pelo prazer. “Naquele instante em que estou roubando, com a arma na mão, sou o dono da vida e mato por que estou com raiva da minha vida!” Afirmou esse jovem ao término da nossa conversa.



Na maioria, esses jovens assaltantes, vêm de famílias de pais trabalhadores, moradores das periferias e que se envolveram com drogas. Suas idades vareiam entre 13 e 25 anos. Uma parte deles assalta para se vestir com roupas de grife, consumir drogas, manter o vício da namorada, ter uma moto para curtir e se impor perante a comunidade. Outra parte obedece aos chefes do tráfico, às milícias e aos donos de desmanches que encomendam carros e motos.

É preciso salientar que a maioria dos jovens da periferia estuda, trabalha e sonha com uma vida mais justa. Numa proporção de 100, menos de 10 se desviam para o mundo do crime. No entanto, essa parcela, somada aos demais crimes praticados pelo crime organizado, pela polícia corrupta e pelos políticos, torna a situação de segurança no Brasil semelhante à de países como a Síria, atualmente num conflito sem solução.

Ainda existe outro somador nesta situação toda, que foi falado em outra matéria do Redator: a Pistolagem. Parece que o Brasil é um país de pistoleiros. Mas o que exatamente a pistolagem e quem são os pistoleiros? Normalmente esses matadores de aluguel são psicopatas que matam não só por dinheiro, mas, também, pelo prazer. Basta ver os últimos crimes encomendados que ocorreram no Brasil: O promotor de Justiça em Pernambuco ficou irreconhecível depois de morto com mais de vinte tiros de arma de grosso calibre; e o advogado criminalista em Belo horizonte teve o corpo dilacerado por disparos de fuzil e pistola ponto 40.

No entanto, tal como dito no início desta matéria, o normal seria indignar-nos com toda essa barbaridade. Mas, não. Não estamos nos indignando e aplaudimos quando os assaltantes são fuzilados, sejam dentro de estabelecimentos comerciais por um desconhecido ( desconhecido, será?) ou em plena rua, à luz do dia por um policial. Não que esteja errado revidar um crime de forma enérgica. No entanto, quando nos acostumamos com a guerra urbana, assistindo como normal em tiroteio no meio da rua, onde as pessoas tombam mortas, algo está errado com os nossos conceitos. Precisamos perceber que estamos numa sociedade que se diz livre, democrática e que busca a justiça. Quando nos aprece normal a guerra urbana, precisamos saber, também, que passamos a faze parte dela e que podemos tombar mortos a qualquer momento.

Não podemos aceitar que a defesa do direito fundamental à segurança seja precedido pela guerra urbana, pelo medo de ser morto, pelo horror de ver corpos estraçalhados todos os dias e em todos os lugares. Precisamos ter consciência de que os donos do poder não estão sendo humilhados e atacados diariamente pelo crime organizado; da mesma forma, estão protegidos os donos das indústrias e os banqueiros. Não se está criticando o direito que eles têm de ser ricos. Mas, apenas exigindo o mesmo direito que eles têm de não serem mortos ao cruzarem a esquina da rua onde moram.



Alguma coisa tem que ser feita com urgência. Um câncer está se espalhando pela sociedade brasileira e sem remédio que o amenize. Basta ver que 25 policiais foram incriminados pela tortura e morte do pedreiro Amarildo na cidade do rio e Janeiro. Até um Coronel foi denunciado. Praticamente todos os policiais da Unidade de Polícia Pacificadora da Rocinha - UPP foram afastados e estão sendo denunciados pelo Ministério Público. Esse fato exemplifica a doença crônica que assola nossas instituições. Bandidos armados vestem fardas da policia militar ou usam distintivos da polícia civil; deputados são mantidos nos seus cargos, mesmo estando presos; juízes continuam sentenciando, mesmo tendo provas contundentes sobre seus atos; e governadores e secretários são investigados suspeitos de receberem propinas de empresa francesa.


Texto de Pedro paulo de Oliveira

Foto; Facebook

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

UM PROMOTOR DE JUSTIÇA, A TERRA E UM ASSASSINATO BÁRBARO NO SERTÃO DO BRASIL.




O que pode motivar alguém a praticar um crime bárbaro mesmo diante da possibilidade de ser descoberto, preso e até ser morto também? A primeira possibilidade que motiva crimes no Brasil é que, mesmo sendo eles perpetrados contra autoridades, a prisão será, apenas, um detalhe e a condenação, baseada, no Código de Processo Penal, uma piada, em que o assassino, por mais cruel que seja, não será condenado a pena superior a trinta anos. Com um detalhe: mesmo havendo agravantes que não permitam a redução da pena, o condenado sempre será beneficiado pelo sistema.

No Brasil existe outro tipo de problema: a pistolagem. Nas capitais, nas grandes cidades e no sertão do país, matar alguém é apenas um detalhe. Como já foi dito pelo Redator, nas grandes cidades, mata-se por um par de tênis, por uma motocicleta, por R$100,00, por ciúmes, por conta das disputas de territórios entre os traficantes e pela corrupção e covardia de policiais bandidos. No entanto, fala-se muito pouco da criminalidade no Sertão do Brasil.

Para que possamos entender melhor, o Sertão do Brasil localiza-se em grande parte da Bahia, de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Piauí. No Ceará, o Sertão ocupa praticamente todo o estado. Já nos estados de Sergipe e Alagoas, o Sertão ocupa uma pequena parcela. Por fim, o Sertão avança em grande parte do Norte de Minas e do Vale do Jequitinhonha no estado de Minas Gerais. Como se pode perceber, o Sertão localiza-se numa região do Brasil que foi, por muito tempo, esquecida pelas autoridades e ainda é usada como moeda de troca por políticos corruptos. O índice de analfabetismo nessa região é altíssimo e os salários pagos aos trabalhadores não chegam a um terço do Salário Mínimo. As condições de saneamento básico são péssimas, não existindo praticamente nas periferias das cidades e na zona rural. Com isso, a mortalidade infantil é uma das mais elevadas do mundo e a perspectiva de vida da maior parte da população não passa dos 50 anos.



Thiago Faria de Soares há pouco tempo postou na rede social, na sua página pessoal, um depoimento aos seus ex-alunos pedindo-lhes desculpas pela falta de comunicação. Dizia ele que sentia saudade dos tempos de professor e que estava falando de um hotel, pois estaria indo acertar com a editora a publicação de mais dois livros de sua autoria. Destacava, ainda, que estava muito feliz como promotor de justiça, um sonho realizado. No entanto, dizia que não tinha tempo para quase nada, mas que estava pensando em aceitar um convite para voltar a dar aulas. Fez questão de falar de uma pessoa especial (sua namorada), mulher de fibra, trabalhadora e companheira fiel. Falou, enfim, de uma cirurgia de hérnia pela qual passou e que Deus estava presente em sua vida.
Thiago, no seu depoimento não citou, em momento algum, detalhes de qualquer problema que estivesse vivendo. Mas, havia um enigma grave na sua vida. Logo que foi nomeado promotor, enviaram-no para o Agreste Pernambucano, exatamente para Itaíba, uma cidade com aproximadamente 30 mil habitantes e localizada a 400 km da capital. De certa forma, ele gostou da mudança. Precisava recomeçar sua vida depois de terminar seu casamento. Enquanto atuava como Promotor de Justiça, conheceu Mysheva Freire Ferrão Martins e, em pouco tempo os dois estavam namorando. Mysheva, no entanto, era descendente de uma família poderosa do agreste de Pernambuco e sobre a qual pesava várias acusações de crimes, incluindo assassinatos.

Thiago, mesmo não querendo se envolver nos negócios pessoais da namorada e da família Martins, à qual ela pertencia, descobriu que ela estava às voltas com uma disputa por terras na vizinha cidade de Águas Belas. Ela havia arrematado 25 hectares de terra na zona rural dessa cidade por 100 mil reais em um leilão da justiça trabalhista. No entanto, a pessoa que ocupava essas terras era nada menos e nada menos que Zé Maria de Mané Pedo, apelido de José Maria Pedro Rosendo Barbosa, homem poderoso, temido e sobre o qual pesa vários processos, inclusive por suspeita de assassinatos. Além disso, a família de Mysheva era desafeta da família de Mané Pedo. O pai de Mysheva é suspeito de ter mandado matar Mané Pedo, o que não conseguiu. Ora, a esposa de Mané Pedo era uma das herdeiras desses 25 hectares de terra, mas a antiga dona deixou uma dívida trabalhista, o terreno foi a leilão e acabou sendo arrematado por Mysheva. Mané Pedo tentou a reintegração de posse, acabou perdendo a ação e creditou sua derrota à influência de Thiago na Promotoria.

Mas, para uma pessoa que possui um patrimônio extraordinário como Mané Pedo, o que lhe interessaria uma ninharia de terra de 25 hectares? Ocorre que, nesse pedaço de terra, está localizado um veio de água mineral que rende mais de 1 milhão de reais por ano. Eis a questão. Mané Pedo não queria abrir mão dessa bolada. No entanto, diante da ordem judicial, se viu obrigado a entregar a propriedade para sua nova dona. Mas, ele estava com uma certeza na mente: o promotor de justiça a havia ajudado na ação de reintegração de posse e, talvez, até nos lances do leilão.

Nesse período de disputas judiciais, Mané Pedo e seus familiares ruminaram um ódio implacável contra Thiago, o forasteiro que foi apoiar a advogada. Thiago, por sua vez, protegido pela capa do Ministério Público, partiu para o ataque, visitou as terras de Mané Pedo e fotografou vários crimes ambientais sendo praticados por lá. Foi a gota d’água. Mané Pedo se irou de vez.





O CRIME.

Noite de domingo, 13 de outubro de 2013, zona rural de Águas Belas, no Agreste pernambucano. O vento sopra morno e levanta uma fina poeira que forma pequenos redemoinhos. Faz dias que não chove. Mané Pedo está na varanda da sua casa, de pé e parece impaciente, olhando a estrada que se desenha na paisagem e se perde nas sombras. Algumas pessoas proseiam na sala, quase cochichando, como se temessem ser ouvidas por pessoas indiscretas. Mané Pedo Aguça o ouvido, dobra a cabeça e coloca a mão em forma de concha sobre a orelha. Escutou o ronco de um carro se aproximando. Logo, um Fiat Uno se desenha na estrada, aproxima-se da varanda, estaciona e dele desce um sujeito ventrudo, de estatura média, cabelos grisalhos e entradas de calvície na fronte larga. Os dois homens se olham e Mané Pedo ordena:
---- Vamos entrar Edmacy.
Edmacy entrou, cumprimentou cada um dos presentes, serviu-se de bebida numa garrafa sobre a mesa e se sentou. Mané Pedo, demonstrando muito nervosismo, perguntou-lhe:
---- Veio preparado?
---- Sim. Está tudo lá no carro e já carregado. Só preciso saber quem vai comigo.
Mané Pedo mostra-lhe um homem, em silêncio, sentado no canto da sala e lhe explica como deveria ser:
---- Apenas o doutorzinho deve morrer. Se a namorada estiver com ele, deixa ela ir embora. Não quero encrenca com a família dela. Você sabe bem por que. Não quero nenhum membro da minha família morto. Se não acontecer nada com ela, não teremos uma guerra por aqui. Você entendeu?
Edmacy não gosta da ideia. É um matador frio profissional. Não gosta de deixar rastro. Por isso, contesta:
---- O senhor sabe que serei reconhecido e a polícia vai me apertar até não poder mais.
---- Eu sei o que quer dizer. Se alguém tiver que pagar, seremos nós dois e teremos os melhores advogados, liderado pelo meu filho que é doutor da lei e não tem medo de polícia ou de juiz.

Edmacy entende o que Mané Pedo está lhe dizendo. É um pacto de honra, onde a pistolagem tem o seu preço e tem os seus acordos.


Manhã do dia 14 de outubro de 2013 em Águas Belas, no Sertão pernambucano. Thiago se levanta por volta das 7 horas, faz a sua higiene e toma o seu café, bem da forma como faz todos os dias. Está um pouco cansado. Debruçou-se sobre vários processos durante o final de semana, inclusive alguns relativos a Mané Pedo. Olha através da vidraça a movimentação que se inicia na rua e lembra que há duas semanas pediu para ser substituído nos processos que envolviam suspeitas contra Mané Pedo e o Ministério Público de Pernambuco achou melhor transferi-lo de comarca. Mas, como a publicação ainda não havia saído, tinha que dar andamento nos processos em Itaíba.

Thiago sabe que, da mesma forma que recaem muitas suspeitas sobre a família de Mané Pedo, a família da sua noiva também é investigada. Isso o incomoda em excesso. Como representante do Ministério Público, ele tem que ser imparcial e manter um limite onde o pessoal não pode extrapolar o público. No entanto, ele sabe que, namorando Mysheva, gostando dela em excesso ele ultrapassou esses limites ao tirar as fotografias da propriedade de Mané Pedo.

Thiago olha o relógio, suspira fundo, sente um calafrio perpassar-lhe o corpo, anda pela sala, de um lado para o outro por mais de um minuto. Depois, sai de casa, retira o carro da garagem e vislumbra Mysheva chegando com o seu tio. Desce do veículo e vai na sua direção. Ela o abraça e o beija.
---- Vamos embora? - Pergunta Thiago aos dois.
---- Sim. - Responde Mysheva, mostrando várias pastas com processos – Já peguei tudo que precisava para hoje.
Em poucos instantes eles ganham a Rodovia Estadual P300. Thiago liga o som e tenta encontrar uma rádio. Mysheva ri e diz que naquele fim mundo as rádios não pegam. Só quando chegassem a Itaíba. Thiago procura, então, o pen drive. É Mysheva quem o encontra no porta-luvas. Uma seleção de Música Popular Brasileira toca para os ouvidos dos viajantes. O tio de Mysheva não gosta. Prefere forró ou sertanejo.
Thiago olha no retrovisor e vê que um Fiat Uno preto segue a poucos metros da sua traseira. Olha para Mysheva, sorri e lhe pergunta:
---- Tudo arrumado para primeiro de novembro?
---- Claro, meu amor. – Responde ela, acariciando-o na face. - Nosso casamento será o acontecimento do ano. Afinal, estou me casando com a pessoa mais especial desse mundo.
Ele sorri novamente. Sente-se extremamente feliz. Mas, nesse instante, seu carro recebe o impacto de duas explosões. Ele olha para o lado e vê o Fiat Uno pareado com ele. Os vidros traseiros do seu carro estão espatifados e o tio Mysheva está deitado no banco. O carona do Fiat manda que ele encoste. Thiago não sabe o que fazer. Olha para Mysheva ,que pergunta, apavorada:
---- Meu Deus, o que eles querem?
---- Não sei, meu amor. Mandaram eu encostar. Vou obedecer. São ladrões, com certeza, e vão levar o carro, nosso dinheiro e nossos pertences.
Logo que ele encosta, quem desce do Fiat Uno é Edmacy, empunhando uma espingarda calibre 12. Seus olhos estão vermelhos e esbugalhados. Ele avança como um raio e atira várias vezes na cabeça de Thiago que não tem tempo sequer de levantar as mãos para pedir por clemência. Edmacy olha para Mysheva gritando por socorro e sacode a cabeça. Ela pula do carro e foge desesperada, seguida por seu tio. Edmacy entra de volta no seu carro e desaparece.
No automóvel, estacionado no acostamento, o corpo caído para o lado, com parte da cabeça dilacerada pelos tiros, Thiago encerra seus sonhos de professor, de escritor já consagrado e de Promotor de Justiça. O jovem promotor finda, também, no Agreste de Pernambuco, como tantos outros pernambucanos ao longo do tempo, seu sonho apaixonado de construir uma nova família. A pistolagem, implacável entre os desafetos, numa região onde ainda prevalece a Lei de Talião, termina com mais uma vida, destrói uma mente, talvez, brilhante.


CONCLUSÃO





Num lugar onde não existem heróis e a lei consegue ser muito pouco eficiente e só age de forma contundente quando é ferida no seu cerne, como no caso do assassinato do Promotor Thiago, parece que o cangaço ainda existe. No sertão, em meio à miséria, o poder é exercido, ainda, por uma espécie de coronelismo, onde os desafetos são eliminados por pistoleiros profissionais, homens que não se importam de ser presos ou mortos. Como a lei no Brasil é pouco implacável, existe um paralelo entre os assassinatos, sejam eles praticados nas grandes cidades, sejam no sertão. O criminoso, ao praticar um crime cruel, sempre pensa que haverá uma saída para ele. Ele até foge. Mas pensa: “Se eu for pego, cumpro a pena e saio logo, enquanto o outro, nunca mais volta”.



Texto de Pedro Paulo de Oliveira.




O VOTO - POR CECÍLIA MEIRELES.




O texto, a seguir, é creditado à extraordinária poeta Cecília Meireles e foi publicado na revista "O Cruzeiro" em 1947 e me foi enviado por Geraldo Mendes, amigo de Belo Horizonte, engajado nas lutas sociais e conscientização das pessoas.


“Pelo voto, não se serve a um amigo, não se combate um inimigo, não se presta ato de obediência a um chefe, não se satisfaz uma simpatia”.

“Pelo voto, a gente escolhe, de maneira definitiva e irrecorrível, o indivíduo ou grupo de indivíduos que nos vão governar por determinado prazo de tempo”.
...

E agora um conselho final, que pode parecer um mau conselho, mas no fundo é muito honesto:

Meu amigo e leitor, se você estiver comprometido a votar com alguém, se sofrer pressão de algum poderoso para sufragar este ou aquele candidato, não se preocupe.

Não se prenda infantilmente a uma promessa arrancada à sua pobreza, à sua dependência ou à sua timidez. Lembre-se de que o voto é secreto.

Se o obrigam a prometer, prometa. Se tiver medo de dizer não, diga sim. O crime não é seu, mas de quem tenta violar a sua livre escolha.

Se, do lado de fora da seção eleitoral, você depende e tem medo, não se esqueça de que DENTRO DA CABINE INDEVASSÁVEL VOCÊ É UM HOMEM LIVRE.



Falte com a palavra dada à forca, e escute apenas a sua consciência. “Palavras, o vento leva, mas a consciência não muda nunca, acompanha a gente até o inferno”.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

ERA UMA VEZ AMARILDO, UM PEDREIRO DA ROCINHA, FAVELA DO RIO DE JANEIRO.




   Existiria uma conexão entre as mortes trágicas? O que poderia haver entre a tortura e o assassinato de um pedreiro, no Rio de Janeiro, com tantas outras mortes? Aparentemente nenhuma. Amarildo era apenas um homem simples, vivendo numa favela carioca, sobrevivendo de “bicos e pescaria” e que, de alguma forma, incomodou todos os policiais da Unidade de Polícia Pacificadora – UPP, da Rocinha, na cidade do Rio de Janeiro. Sua morte poderia passar despercebida do mundo, se tivesse sido perpetrada pelos traficantes como queriam fazer acreditar os Policiais acusados de tortura-lo e mata-lo. Agora, sua morte tem tudo a ver com todas as mortes perpetradas covardemente no Rio de Janeiro e no Brasil.

   A narrativa, a seguir, se baseou em fatos apurados pela imprensa e pela Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro. Os últimos momentos de vida de Amarildo, da forma como foi exposta por mim, retratam, também, o que a polícia suspeita e investiga, não representando, ainda, a versão final do acontecido. No entanto, procurei ser o mais real possível nas narrativas da vida do Pedreiro Amarildo, e peço escusas à sua família por possíveis falhas com relação a nomes, lugares e datas.


AMARILDO

   Amarildo, sujeito simples, estatura mediana, rijo, pele queimada pelo sol, dentes mal cuidados, sem cultura. Nasceu olhando o mar com o seu pai, na Praça XV. Menino de olhos grandes e brilhantes, segurando a mão da mãe, ficava olhando seu pai entrar no barco de pesca e sumir na imensidão de água. Algum tempo depois, viu o mesmo homem levantando um barraco no morro que se chamava Rocinha, onde os trabalhadores plantavam milho, mandioca e verduras. O lugar era mesmo cheio de rocinhas. Foi lá que os avós de Amarildo chegaram de Petrópolis e ajudaram a iniciar a comunidade, gente negra, descendente de escravos, pessoas que queriam uma nova vida, livre dos grilhões da escravidão, cheios de sonhos dentro da “cidade maravilhosa”.

   Com o tempo, o menino Amarildo percebeu que o barraco onde morava era estreito e pouco para tanta gente: ele e mais onze irmãos. Mas, não faltava peixe, feijão, arroz, mandioca e fubá. Sua mãe foi trabalhar na casa de gente famosa. Esse trabalho ajudou a manter a numerosa família. Mas, não trouxe nenhum progresso para os seus membros. Amarildo lembra, apenas, que ela saía todos os dias, muito cedo, ia para o Bairro Leblon – bairro de gente rica - e só voltava quando a noite já havia tomado conta do morro.


AMARILDO POR AMARILDO

   Meu pai... Lembro pouco dele, homem de raras palavras – de olhar penetrante e que significava muita coisa -, indo e vindo de barco, cheirando peixe, sumindo e voltando do mundão de água salgada. Minha mãe me levava na Praça, com o montão de irmãos, pra olhar o mar e ver o seu homem indo embora. Depois, ela comprava algodão doce e pipoca pra gente. Era uma festa só a volta pro morro, subindo pelas escadas feitas pelo vovô e seus amigos. Do alto eu via a cidade, eu olhava o mar, eu sonhava ser pescador.  Era o ano de 1972.

   Lembro-me de minha mãe, cansada, chegando em casa numa sexta-feira. Havia chovido durante o dia e fazia muito calor. A pobre mulher suava muito. Mesmo assim foi para a cozinha fazer a janta para os seus doze filhos. Meu pai chegou e ela rezingou, cozinhando peixe com mandioca. Não lhe deu confiança. Ele a olhou e perguntou:
---- O que foi mulher?
---- Nada! – Respondeu ela secamente.
---- Esse seu nada não é de nada, minha nega. Num me convence. Diz pra mim o que tá havendo?
   Ela permaneceu em silêncio, foi colocando a comida nos pratos dos filhos e olhando cada um deles com ternura.
---- O que foi, mulher? – Insistiu nosso pai, com carinho.
A mulher, mãe de tantos filhos, soltou um muxoxo e respondeu:
---- A patroa... Quer um dos nossos pequenos pra ela criar. Onde já se viu! Filho que eu pari não sai do meu teto enquanto não virar homem ou mulher de verdade. É assim que é.
   O pescador ficou em silêncio. Conhecia bem a fibra daquela mulher e se lembrou do dia em que a viu pela primeira vez na Praça XV de Novembro. Ele a admirou, faceira, olhando o mar e sorrindo pra ele. Ele chegou perto dela, meio sem jeito, e ela perguntou:
---- Você é pescador?
---- Sim. – Respondeu ele. – Por quê?
Ela riu.
---- Está fedendo peixe. Tem mais: se quer alguma coisa comigo, já sou mãe. Mas, não sou vagabunda.
   Ele compreendia o orgulho dela. Eu não entendi muito bem o que estava havendo. Tinha apenas três anos de idade e tratei de comer com um prazer absoluto. Estava delicioso. Meu pai se acomodou num canto da cozinha, segurando uma cuia cheia do ensopado, comeu, se levantou, passou mão na cabeça de cada um dos filhos e foi para o quarto. Fui atrás dele em silêncio e fiquei olhando ele emendar a rede de pesca e amarrar nela os pedaços de chumbo. Era um trabalho de paciência, iluminado por uma lamparina, com os olhos quase grudados nos fios entrelaçados e presos em pequeninas amarrações.
---- Vem cá. – Ordenou ele com o braço esticado e gesticulando na minha direção.
---- Quer aprender a pescar?
   Eu sacudi a cabeça timidamente dizendo que sim, olhando cabisbaixo para aquele homem com a pele negra brilhando sob a chama tremulante. Ele me parecia muito grande e poderoso. Era isso que ele era: um gigante dos mares.
---- Então, no domingo, vamos lá nas pedras do Arpoador.
   Fiquei um pouco frustrado com aquela decisão do meu pai. Eu pensei que ia me levar com ele pro mar. Não. Ele apenas me levaria até as pedras que ficavam de frente pras praias. Acho que ele percebeu minha frustração, mandou que eu sentasse ao seu lado e disse:
---- O mar é traiçoeiro, menino. Você não pode ir comigo no barco. Não tem segurança pra uma criança. Quem sabe um dia eu tenha um barco maior e seguro. 

   No domingo, pela manhã, muito cedo, apenas com a luz da aurora iluminando os cantos do céu, eu e meu pai subimos até o alto do morro onde ele havia deixado algumas varas de bambu secando. Em poucos minutos ele me ensinou a transformar aquelas varas flexíveis e rijas em instrumentos eficientes de pesca, perpassando elas de leve e calmamente no fogo. Aprendi com os olhos. Muitos anos mais tarde eu arrumaria minhas varas lembrando aquele momento. Depois, voltamos para casa, onde Arildo, meu irmão de seis anos, nos esperava. Pegamos as mochilas e fomos pras bandas de Ipanema. Descemos do ônibus e seguimos pelas areias até as pedras do Arpoador. 

   No início era bonito ficar olhando meu pai preparar as iscas, pedacinhos de outros peixes, minhocas roliças, fatias de queijo azedo e pele de frango. Ele olhava pro mar e eu não conseguia separar os dois. Pareciam feitos da mesma matéria. Achei que aquele homem tinha sido parido nas águas daquele oceano que rebentava nas pedras, num vai-e-vem de espumas. 

   Ele subiu no alto das rochas escuras, sem camisa, o vento soprando forte na sua pele, e jogou a linha no mar.
---- Olhem bem! – Gritou ele lá do alto. – Venham pra cá!
Eu e Arildo subimos pelas pedras e ficamos ao seu lado. Ele nos viu e ordenou:
---- Levante a vara assim, jogue pra trás, atire a linha o mais longe que puder. Espera sem pressa. Os peixes vão morder. Aí é só puxar a linha de volta que o bicho vem, preso no anzol.

   Ficamos durante a manhã de frente pra praia de Ipanema. Foi lá que, no colo daquele homem fascinante, fisguei minha primeira enchova. A ponta da vara se dobrou quase formando um meio círculo. Meu coração disparou e eu puxei a linha de uma vez. Meu pai riu muito. Sua gargalhada se misturou ao som do mar batendo nas rochas. Fiquei sem entender por que ele riu tanto. Mas o que importava entender suas risadas, se elas me faziam felizes?

   Na hora do almoço, ele juntou os peixes que pegamos e foi com agente até um restaurante de frente com a praia, onde trocou tudo por três refeições. Fiquei decepcionado. Queria levar aqueles bichos pra casa. Ele explicou:
---- Levaremos pra casa o que pescarmos durante a tarde.

   Depois do almoço voltamos pras pedras e ficamos de frente com a Praia do Diabo. Eu nunca soube a razão daquele nome feio para um lugar tão bonito. Mas, vá lá. Quem batizou o lugar devia ter lá suas razões pra escolhe o nome. De barriga cheia, eu e Arildo passamos parte da tarde brincando em vez de pescar. Corremos pela areia e desbravamos lugares entre as pedras por onde os repteis zanzavam em busca de alimentos. No final do dia, voltamos à pescaria e, no colo do meu pai, peguei ainda outras enchovas. 

   Chegamos em casa junto com a noite. Arildo, eu acho que não se ligava muito em pescaria. Meu pai, tratou ele mesmo de limpar os peixes e me chamou para eu ver mais esse ofício. Aprendi e, durante toda a minha vida, nunca gostei que limpassem os peixes que eu levava para casa. 

   Minha irmã mais velha, Eunice, lembro que ela não gostava muito das coisas que fazíamos. Olhava, de longe, toda a movimentação em volta dos peixes. Depois, saia às voltas com as coisas da vovó, aprendendo sobre umbanda. Minha mãe sempre falava:
---- Essa menina ainda vai montar um centro de umbanda pra ela.
   Verdade. Ela levava jeito pra esse ofício. Já era uma moça, dançava bem, deixava o santo baixar nela nas comemorações do nosso povo. Quando eu digo nosso povo, quero dizer os que nasceram das mulheres que vieram, na marra, da África, foram feitas escravas e, um dia, mal libertadas, deixaram suas fazendas e formaram essas comunidades aqui no Rio de Janeiro, longe dos ricos, longe do luxo. Pois então, minha irmã estava aprendendo a jogar búzios. Achei aquele negócio até interessante. Era bonito ver ela sentada com uma peneira no colo, jogando pedras e conchas pro ar, catando uma a uma e predizendo o futuro das pessoas. Engraçado é que muitas vezes ela acertava. Ela não é filha do meu pai. Gosto dela assim mesmo. Quando meu pai se apaixonou pela minha mãe, já existia Eunice. 

   Numa quarta-feira do mês de outubro, acho que foi depois do dia 15, a noite já ia alta e meu pai não chegava. E eu meus irmãos já estávamos na cama e, por conta do nervosismo do atraso dele, ninguém conseguia dormir. Enfim, alguém bateu na porta do barraco e gritou pra abrir a porta. Era meu pai chegando carregado, com a perna toda enfaixada e gritando muito. Fiquei sabendo que o seu barco havia sofrido um acidente e parte da sua perna estava toda arrebentada. Fizeram o que podiam no hospital e mandaram ele pra casa. Foi assim que ele morreu, poucos dias depois, com uma das pernas apodrecida e gritando de dor. Minha mãe enterrou o marido e companheiro pescador numa cova qualquer do cemitério, olhou para os filhos e disse:
---- Droga de vida. Agora estou sozinha pra criar vocês todos. Mas, Deus proverá. Vou dar conta.

   A lembrança do meu pai ficou meio embaçada na minha mente. Eu era muito pequeno quando ele se foi. O tempo foi passando, eu fiz onze anos. A Rocinha cresceu muito em pouco tempo, assim como todas as favelas desta cidade. Com isso, cresceu também os problemas. Muita gente ruim passou a viver entre nós, gente carregando espingardas, revólveres e vendendo drogas. Mas, minha mãe sempre nos dizia para ficar longe dessa gente e nunca brigar com eles.
---- Respeita eles. – dizia ela para os filhos. – Sorria pra eles, mas nunca aceite as merdas que eles vendem ou trabalhem pra eles.

   Nossas casas ficavam todas pertinho uma das outras na Rocinha. Numa tarde de terça-feira, no mês de julho de 1981, não me lembro do dia certo, eu chegava da escola e vi muita fumaça perto de casa. Subi correndo e vi que o fogo se alastrava na casa dos meus tios. As pessoas gritavam que as crianças estavam lá.
---- Quem tá lá? – Perguntei, olhando pro barraco sendo consumido pelo fogo.
---- O Robinho e a irmã dele. – Escutei uma voz gritando atrás de mim
   
   Robinho era apenas um garotinho, ainda de colo, e sua irmã, uma menina de oito anos. Não tive dúvida em tomar uma atitude. Entrei no barraco, fui até o quarto e vi o berço de Robinho em chamas. Enfrentei a fogueira e sai do barraco com Robinho no colo. Mas, quando tentei voltar pra salvar sua irmã, era tarde demais. Fiquei muito frustrado. Chorei durante o resto do dia. Robinho, no entanto, sofreu muitas queimaduras e precisou ficar muitos meses no hospital até se recuperar. 

   Bem... O tempo passa pra todo mundo. Eu não sou exceção. Cresci e descobri que precisava arranjar uma forma de ganhar dinheiro. Aprendi o ofício de pedreiro. Mas, cá no morro, é uma profissão pouco valorizada. Ninguém pode pagar bem. Mas, tem uma coisa que gosto muito de fazer e que me dá uma renda extra: pescar. Herdei essa vocação do meu velho, que Deus o tenha. Pena que não pude comprar um barco. Quem sabe, um dia... Quem sabe.

   Como tempo anda mesmo e não espera ninguém, tornei-me um homem e, como fazia sempre, já com os meus dezoito anos, desci pra Ipanema num domingo de dezembro, de sol ardido e muito movimento. Eu só queria passear, vadiar, paquerar umas meninas pra ver no que dava. Quem sabe eu arrumava uma namorada pra dar uns beijos, uns agarros. 

Ipanema, sempre bonita, parecia mais deslumbrante naquele dia. Cheia de gente bonita. Ipanema é famosa. Tem até música feita por um maestro famoso.

   Foi, então, que vi Bete sentadinha num banco, quietinha, olhando de rabo de olho pra mim. Eu logo pensei que ela estava no papo. Não deu outra. Cheguei de mansinho, como quem não quer nada, igual gato. Alguém já viu gato quando quer carinho? Ele chega todo sem vergonha e se enrosca na gente. Fiz mais ou menos assim com a Bete. Ela ficou ali conversando comigo e me perguntando do que eu gostava. Falei das pescarias, do trabalho de pedreiro e do povo da Rocinha. Ela me contou que era do Rio Grande do Norte e que trabalhava em casa de família.
---- Minha mãe trabalha até hoje, também. – Disse eu pra que ela soubesse que trabalho de doméstica era labuta digna.
   
   No final do dia nos despedimos já com um beijo comprido, daqueles de língua mesmo, um abraço apertado e pude sentir o calor do corpo dela. Não pensei duas vezes e lhe disse que queria namorar com ela. Ela aceitou e me falou:
---- Mas, fique sabendo que já tenho duas filhas que vieram comigo do Rio Grande.
---- Não faz mal. – respondi com um sorriso. Quando a gente se casar, a família já estará pronta.
   E foi assim mesmo. Não demorou muito, eu levei ela lá pro morro, construí um puxado pra nós, perto da casa da minha mãe e tratei de trabalhar dobrado pra dar conforto pra minhas filha adotivas e minha mulher.
   
   Nunca tive medo de trabalhar. Muito menos gosto de ver injustiça e gente sofrendo. É o meu jeito. Gosto de ajudar. Se Deus vê, ele me compensa e compensa as pessoas que eu gosto, os da minha família. Ganhei o apelido de Boi por causa desse meu jeito de topar qualquer serviço. Aqui na comunidade tem muita gente que precisa de ajuda, pessoas doentes, aleijadas, idosas que precisam ser carregadas pra passar pelas escadas até chegar onde os carros podem ir. Faço essa caridade com prazer.

   Depois que a Bete foi morar no nosso puxado, minha família foi crescendo. O primeiro dos meus filhos a nascer foi o Anderson. Fiquei muito feliz com a vinda daquele menino que chegou todo enrugado e chorando muito. Os outros foram vindo conforme a vontade de Deus e Bete, sempre disposta, ia cuidando do nosso puxado, um único cômodo que nos servia de sala, quarto e cozinha. Mas, no final, dava tudo certo. Éramos uma família.

   Nos domingos, eu descia sempre pra pescar lá pelas bandas de São Conrado. Ia sozinho pra ficar sossegado e concentrado. Levava minhas varas de bambu. Muitos pescadores, com os seus molinetes sofisticados, ficavam me olhando e alguns, eu acho, até criticavam. Eu queria que eles se danassem. No final do dia eu chegava em casa carregado de peixes graúdos.

   Com o passar dos anos, a Rocinha foi ficando famosa por várias razões. Uma delas foi de que nela nasceram grandes criminosos. Escreveram livros, fizeram filmes e fundaram um monte de organizações para defender o nosso povo. Mas a guerra, de verdade, era pelo comando da comunidade. Os traficantes mandavam e desmandavam num vai e vem de chefes do tráfico. Eles disputavam a área e se matavam. Outras vezes, eram presos. Aí, se trocava o comando. Por mais que morressem chefes e soldados do tráfico, o crime continuava. Nós, moradores, víamos tudo isso e vivíamos nossas vidas, fazendo de conta que era tudo normal: normal os tiros; normal obedecer a bandidos; normal conviver com polícia corrupta e assassina.

   Agora, traficante é assim: se você não quer trabalhar pra ele, tudo bem. Mas não se meta com ele, não atrapalhe o negócio dele, que é vender maconha, cocaína, armas e outras drogas pesadas. O que dói no coração da gente é ver os meninos sonhadores, que mal deixaram seus carrinhos de brinquedo, se tornando soldados dessa guerra maldita e morrendo assassinados, ora pela polícia, ora pelos próprios traficantes. O que acontece? Meninos não têm muito juízo. Às vezes aprontam, deixam de cumprir uma ordem, pagar uma dívida, esquecem do horário de explodir o foguete ou de empinar o papagaio. Não tem perdão. O chefe manda matar. Quando tem guerra pelo comando da área, são os meninos que vão dar tiro; e quando tem que enfrentar a polícia, são os meninos que vão pros becos com armas que nem conhecem direito. A polícia é treinada. Esses garotos não. Já cansei de ver meninos, filhos de amigos meus, serem mortos nesses becos. Dá dó, uma dó de cortar o coração, uma coisa que esvazia o estômago da gente e provoca ânsia de vômito.

   Escutei, faz um tempo, que no Rio de Janeiro vai ter a copa do mundo e as olímpiadas. Penso que ser uma boa coisa pro Brasil. Mas tem tanta pobreza por ai que acho que nem tudo vai ser bonito. Depois que anunciaram essas coisas, o governo inventou a tal de Unidade de Polícia Pacificadora. O negócio é o seguinte: Primeiro, eles mandam o BOPE invadir a favela. Sobe o caveirão, policiais dando tiro pra tudo que é banda e os traficantes saem correndo. Traficante não é bobo, não. Sabe quando tem que fugir, dar um tempo, pra depois, voltar e ocupar o lugar que deixou 

   Depois que o BOPE faz a limpeza, o governo manda, pra tomar conta da gente, com o nome de UPP, os mesmos policiais que andavam fazendo besteiras pelas favelas; os mesmo que faziam acordo com os chefes do tráfico; os mesmos que enchiam a gente de medo. Dependendo dos policiais, eles metem mais medo na gente do que os traficantes. A Polícia, quando não presta, é um perigo. Ela pratica o crime usando a farda, nos carros do batalhão, e são unidos para nos matar.

   Foi que aconteceu na Rocinha. Agora, aqui tem uma UPP. Eu sempre digo pros meus filhos ficarem longe dos policiais da UPP. Dá um frio na barriga da gente quando eles passam nas ruas e nos olham. Não sei explicar bem, mas acho que eles se sentem fortes, poderosos, vestidos nas suas fardas. Parece que eles gostam de humilhar a gente, fazer a gente sentir que não é nada na vida, uma titica de galinha.

   Continuo com a minha vida. Meus problemas são grandes e preciso dar dignidade para a minha Bete e os meus filhos. Meu puxado está querendo cair. Comprei lajotas e vou reforçar ele. Depois, levanto um cômodo em cima dele. Ainda sonho com uma vida melhor pra todos. Parece difícil. Aqui na comunidade, os traficantes e os soldados do trafico aparecem menos. Mas todo mundo já voltou e o “negócio” tá funcionando de novo. A única diferença é que quem manda na área, agora, são os homens da UPP. Tem que tomar bênção deles. São os reis da área. 

   Hoje é domingo, dia 14 julho de 2013. Lembro o dia amanhecendo. Estava tudo bonito. Eu ainda sentia o corpo meio dolorido. Carreguei muitos sacos de areia no sábado pra ganhar um extra e vou comprar tudo em cimento na segunda. Resolvi descer o morro até o mar pra pescar. Peguei as varas, despedi de Bete, olhei para o Anderson dormindo e roncando, e ri. Pensei com o meus botões: “que bom que tenho uma família”. Afinal de contas, ninguém vive sem família. Deve ser muito ruim viver sozinho. Eu nunca vivi sem uma família, graças a Deus. 

 No caminho, escutei alguém gritando:
---- Boi, ó Boi! Vem cá!

   Olhei pros lados e vi que me chamavam num barraco. Fui até lá e era pra carregar uma moradora doentinha e que precisava chegar bem depressa no carro que esperava bem longe na rua. Foi moleza pra eu carregar ela até o carro. Depois, no Bar do Júlio, fiquei sabendo que ela melhorou. Bom... Segui meu caminho e fiquei, lá nas pedras, olhando a praia de Ipanema com um bocado de gente. Não estava tão cheia por que o sol nem estava ardendo. Não pesquei muitos peixes, mas o que peguei, deu pro gasto. Voltei pra casa, limpei os bichos e sai pra dar umas voltas. Já estava de noite e fui pra birosca, no Beco do Cotó, papear. O pessoal do Bar do Júlio estava dizendo que os policiais da UPP estavam fazendo um arrastão. Pensei, então, que seria melhor eu ir embora pra casa fritar meus peixes pra evitar confusão. Saí de fininho quando já eram sete e vinte da noite. Mas, pra azar meu, dei de cara com quatro policiais. Conheço todos eles. O que tem o apelido de Cara de Macaco veio contra mim e enfiou a mão no meu bolso. Perguntei o que era e ele gritou comigo:
---- Cala a boca! Estamos procurando drogas e uma chave.
---- Você me conhece. – Respondi meio chateado. – Não mexo com essas coisas.
---- Cadê seus documentos? – Pergunto o Cara de Macaco me olhando nervoso.
   Como eu havia ido até o centro da cidade, estava com meus documentos no bolso. Tirei todos eles e mostrei para o policial nervoso. Ele olhou uma vez, tornou a olhar meus documentos, fingiu que falava no rádio, olhou pra mim e disse:
---- Você vai com a gente, Boi.
   Sem dar nenhuma explicação, eles me levaram até o Parque Ecológico onde funciona a sede da UPP. Mandaram que eu sentasse numa cadeira e ficaram me perguntando coisas sobre os traficantes e dizendo que eu estava aparecendo demais na comunidade. Eu me aborreci e reclamei:
---- Não podem fazer isso comigo. Vou reclamar contra vocês. Sou pobre, mas trabalhador e de bem.
   Acho que o pessoal da comunidade avisou pra Bete que eu tinha sido levado pra sede da UPP. Ela foi até lá, me viu e perguntou o que estava acontecendo.   Eu olhei pra ela e respondi:
---- Não sei, Bete. Meu documento está com o soldado Vital.
O comandante da UPP, Major Edson, foi até a porta e disse pra a Bete que ela podia ir embora que eu logo seria liberado.
---- Vou esperar. – Disse ela ao comandante.
---- A senhora não pode ficar. Se ficar, vai atrapalhar nosso trabalho e atrasar a liberação do seu marido.
   Bete me olhou de novo, deu uma tragada no cigarro e desapareceu através dos becos. Levaram-me, então, pros fundos da UPP. Começaram a gritar comigo. Queriam que eu entregasse a chave de um paiol onde estariam escondidas armas de traficantes. Eu não entendia nada daquilo, não sabia de chave nenhuma. Jogaram água no meu corpo e pegaram dois fios elétricos desencapados e colocaram no meu pescoço. Nossa Senhora! Doeu muito e urinei nas calças. Pedi pelo amor de Deus que parassem. Mas, os policiais estavam loucos. Tiraram a minha roupa e fizeram coisas horríveis comigo. Quando eu já não tinha mias força pra nada, escutei o comandante dizer que não ia sair nada de mim. Eles jogaram meu corpo dentro da viatura, eu já sem forças, só pensando nos meus filhos, na minha Bete e nos meus irmãos. Lá em casa, eles deviam estar esperando eu chegar pra fritar os peixes. 

   O carro da UPP ficou rodando comigo até que parou num lugar. Não sei onde é. Agora, estou perguntando: “Meu Deus, o que vão fazer comigo”? Penso nos meus seis filhos, no meu sonho de sair pescando de barco pelo mar e nas minhas varas de bambu. Tento perceber o que os policiais falam e tudo está muito confuso. Estou com muito medo. Não consigo entender por que eles estão fazendo isso comigo. Nunca fiz mal pra ninguém pra merecer tamanha covardia. Sinto um toque na minha nuca, escuto um baralho ensurdecedor e adormeço lentamente, calmamente.


Texto de autoria de Pedro Paulo de Oliveira.
Todos os direitos reservados.
Reprodução somente com autorização do autor.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

A MORTE DE JOÃO PAULO I, O PAPA SORRISO E O PODER DO CARDEAL RATZINGER - O PAPA BENTO XVI





A eleição havia terminado e a fumaça subia pela chaminé. O novo Papa estava escolhido e, para surpresa dos radicais e conservadores da Igreja Católica, o novo Papa era o humilde e sereno Albino Luciane, um homem que jamais havia almejado ser papa, confessor de homens poderoso e extremamente rígido com as causas sociais.

A princípio, atônito, Luciane teria declinado de aceitar o pontificado. No entanto, fora persuadido do contrário pelo cardeal holandês Johan Willebrands que, sentado a seu lado na Capela Sistina, teria lhe dito: "Coragem! O Senhor dá o fardo, mas também a força para carregá-lo"!

Aquele instante de surpresa prenunciava, contudo, uma tragédia: o pontificado homem humilde e especial haveria de ser curto, marcado pela morte e pelo mistério. Um mês após ser entronado Albino Luciane - João Paulo I – o Papa Sorriso - estava morto em condições que, talvez, nunca sejam esclarecidas.

Um dos inúmeros boatos surgidos após a morte de João Paulo I diz que seu pontificado entrara em choque com ideias e interesses da Opus Dei. Durante o funeral, foram ouvidos fiéis aturdidos, que diziam: "Quem fez isso com você?", "Quem o assassinou?", já desconfiando de que a morte do Papa Sorriso não decorrera de causas naturais.


O jornalista britânico David Yallop publicou em 1984, após longa pesquisa, a obra Em nome de Deus (In God's Name), na qual oferece pistas sobre uma possível conspiração para matar João Paulo I. A dar-se crédito às fontes de Yallop (que incluem inúmeros clérigos e habitantes da cidade do Vaticano), João Paulo I esboçara, no início de seu breve pontificado, uma investigação sobre supostos esquemas de corrupção no IOR (Istituto di Opere Religiose, vulgo Banco do Vaticano). Logo após eleger-se papa, ele foi colocado a par de inúmeras irregularidades no Banco Ambrosiano, então comandado por Roberto Calvi, conhecido pela alcunha de "Banqueiro de Deus" por suas íntimas relações com o IOR (o corpo de Calvi apareceu enforcado numa ponte em Londres, quatro anos depois, por envolvimento com a Máfia).
Entre os envolvidos no esquema de Calvi, estaria o então secretário de Estado do Vaticano e Camerlengo, cardeal Jean Villot, o mafioso siciliano Michele Sindona, o cardeal norte-americano John Cody, na época chefe da arquidiocese de Chicago e o bispo Paul Marcinkus, então presidente do Banco do Vaticano. As nebulosas movimentações financeiras destes não passaram despercebidas pelo Papa Sorriso. Sem falar em supostos membros da loja maçônica P2, como Licio Gelli (vale lembrar que pertencer a essa comunidade secreta sempre foi e ainda é considerado motivo de excomunhão pela Igreja Católica).

A Cúria Romana como um todo rechaçou o perfil humilde e reformista de João Paulo I. Diversos episódios no livro corroborariam essa tendência: o Papa Sorriso sempre repudiou dogmas, ostentação, luxo e formalidades; para ficar num exemplo, ele detestava a sedia gestatória, a liteira papal (argumentando que, por mais que fosse o chefe espiritual de quase um bilhão de católicos, não se sentia importante a ponto de ser carregado nos ombros de pessoas). Após muita insistência curial, ele passou a usá-la.
Seria, no entanto, importante referir que, quando o Cardeal Luciane ascendeu a Papa, o seu estado de saúde encontrava-se já bastante deteriorado.


Segundo Yallop, em 29 de setembro de 1978, João Paulo I anunciaria a remoção de Marcinkus, Cody, Villot e alguns de seus asseclas – o que poderia deixá-los à mercê de processos criminais. Mas Sua Santidade não acordou para levar a cabo as excomunhões: diz-se que teria sido encontrado pela freira Vincenza, que o servia havia 18 anos e que sempre lhe deixava o café todas as manhãs. Naquele fatídico dia, no entanto, ela ficara espantada com o fato de o Papa não ter respondido ao seu Buongiorno, Santo Padre (Bom-dia, Santo Pai); desde os tempos de padre em Veneza, ele nunca dormira além do horário. Notando uma luz acesa por trás da porta, ela entrou nos aposentos do Papa e encontrou-o de pijama, morto, com expressão agonizante, na cama.

Numa ação rápida, assim que os gritos da freira ecoaram pelo palácio, os pertences pessoais do Papa foram, de imediato, removido por Villot que surgiu do nada, como uma assombração. Entre eles, as sandálias do papa. No livro, é defendida a hipótese de que as sandálias estariam manchadas com vômito – um suposto sintoma de envenenamento.

Yallop cita a digitalina (veneno extraído da planta com o mesmo nome) como a droga usada para pôr fim ao pontificado de João Paulo I. Essa toxina demora algumas horas para fazer efeito; Yallop defende que uma dose mínima de digitalina, acrescentada à comida ou à bebida do papa, passaria despercebida e seria suficiente para levá-lo ao óbito. E, para o autor de “Em Nome de Deus”, teria sido muito fácil, para alguém que conhecesse os acessos à cidade do Vaticano, penetrar nos aposentos papais e cometer um crime dessa natureza.

Resta-nos a compreensão de que os interesses daqueles que detêm o cetro do poder religioso não mudaram em nada: conjuram, mentem, roubam e matam.

a prova maior dessa teia pegajosa enredada em volta da Igreja Católica está nos últimos acontecimentos que marcaram a renúncia do Papa Bento XVI. Bento XVI à época da morte de João Paulo I era o Cardeal Ratzinger, um dos homens mais importantes da Igreja Católica, presidindo nada mais e nada menos que a poderosa Congregação Para a Doutrina da Fé. Foi dele o trabalho e os bastidores que elegeram Karol Wojtyla, o Papa João Paulo II. Depois da morte de João Paulo II, ele se tornou papa. Depois de um pontificado marcado pelo radicalismo, declarações polêmicas, escândalos de proteção a padres pedófilos e corrupção financeira em todas as autarquias do Vaticano, ele renunciou, em minha opinião, num golpe de mestre e, mais uma vez, elegeu um papa, segundo seus preceitos.

A renúncia de Bento XVI foi mais um golpe político nos seus adversários do que simplesmente um ato de humildade. Ele se viu enfraquecido física e mentalmente. Viu a morte se aproximando e percebeu que, morto, não poderia conduzir, com garantia, a sua sucessão. Assim, avisou que deixaria o pontificado e, ao estilo de Maquiavel, conduziu com maestria a sua sucessão. Deixou que o mundo especulasse e os cardeais conjurassem. No entanto, já estava decidido, entre os seus fiéis seguidores, quem seria o novo papa: Jorge Mário Bergoglio, que se autodenominou Papa Francisco ou Francisco I.

O novo papa, é um fiel seguidor dos preceitos de Bento XVI desde os tempos da Congregação Para a Doutrina da Fé e o Cardeal Ratzinger tem plena consciência disso. Na sua casa de repouso ele curte seus últimos dias sabendo que a sua influência sobre a Igreja Católica, que se iniciou logo após o Concílio Vaticano II, ainda perdurará por muitos anos.

Mas o que tem a ver a influência do Cardeal Ratzinger com a morte de João Paulo I? Talvez a resposta para o mistério que envolve, até hoje, essa morte, esteja na casa de repouso onde descansa Bento XVI, no brilho dos seus olhos fundos e nos seus gestos cadenciados.


Por que a Igreja Católica faz questão de esquecer esse papa ao mesmo tempo em que santifica João Paulo II? Somente em raras ocasiões o Cardeal Ratzinger falou de Albino Luciane como membro da Cúria Romana, como servo de Deus e como o Papa João Paulo I. Pelo contrário, sempre quis ofuscar a sua imagem com o brilho do seu sucessor. O Servo humilde de Deus, o Papa Sorriso, o homem que teve coragem de enfrentar a máfia do Vaticano, parece fadado ao esquecimento. Essa máfia, hoje, não novidade para ninguém, pois foi denunciada pelo próprio Bento XVI antes de renunciar ao trono e entronar Francisco.


Texto de Pedro Paulo de Oliveira
Revisado em 15 de outubro de 2013.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

TOLERÂNCIA E PERMISSIVIDADE.




Acaso alguém tem alguma dúvida de que o ser humano é um primata bípede e dotado de faculdades que o torna superior aos seus semelhantes que coabitam a face do planeta terra? Não. Ninguém pode ter dúvidas de que o ser humano se diferencia bastante dos cangurus e dos gorilas, pelo simples fato de que aprendeu a modificar o meio em que vive através de ações da sua mente. As civilizações, construídas e espalhadas pela terra ao longo do tempo pelos seres humanos, se basearam todas na transformação do meio ambiente. Os seres humanos, diferentes dos demais animais, aprenderam a transformar a matéria e criaram as cidades e tudo que nelas se insere.

Como qualquer animal, o ser humano é dotado de instinto de sobrevivência, bem como de outros instintos. Desde a sua concepção no útero materno, o ser humano passa a lutar para viver como qualquer outro ser vivo, com a diferença de que tem consciência da vida e da morte.

Observem a formiga: ela não sabe que pode ser pisoteada e exterminada no seu próprio habitat. No entanto, ao se ver diante da morte, ela recua, foge e procura um abrigo onde possa se esconder do fim iminente da sua caminhada. Parece nada a morte de uma formiga. No entanto, o princípio é o mesmo: concepção, existência e fenecimento.

Ao destacar o bipedismo do ser humano, fica clara a sua diferença no reino animal. Andar sobre duas patas, no caso, sobre dois pés, tem sido uma árdua tarefa para a humanidade que prefere inventar meios de locomoção que a leve rapidamente a outros lugares da terra e do espaço sideral, na sua ânsia pela aventura e em descobrir novos lugares, desbravar o desconhecido e conquistar novas civilizações. Por isso, os seres humanos pensam. “Penso, logo existo”. Esta afirmação é de René Descartes que, após duvidar da sua própria existência, entendeu-se vivo após ter consciência do seu pensamento.



O ser humano é tão complexo na sua minúscula e grandiosa diferença com os demais seres do reino animal, que destrói seu próprio meio e é capaz de matar seus semelhantes para conseguir realizar seus desejos. Aonde vai dar toda essa sanha é difícil prever. Claro que na destruição do meio ambiente e de outros animais, sempre haverá um meio termo e aqueles que lutarão para que a terra continue com o seu papel de casa. Esse meio termo, esse embate entre o que parece o bem e o mal, enquanto uns destroem em nome do progresso, outros defendem e reconstroem a natureza, ditará, sempre, as regras da vida.

Serão os que constroem as indústrias e todos os meios contemporâneos os vilões? Não. Claro que não. Eles, cientistas e grandes empresários, são os responsáveis pela evolução da humanidade. O que sobra então para os que defendem o meio ambiente, os oprimidos, os miseráveis e os excluídos? Sobra-lhes uma batalha muitas vezes inglória e em estado de desvantagem.Contudo, eles são o meio termo, a barreira que impede que a modernidade destrua o planeta terra.

A humanidade está caminhando para um novo paradigma, uma junção de tudo que ela já viveu para se construir um novo modelo de convivência. Claro que ainda existem civilizações que teimam em manter modelos atrasados, entre elas destaca-se a Síria e poderíamos incluir o Brasil com os seus graves problemas estruturais, tendo, como principal, o de segurança. As autoridades brasileiras não conseguem resolver e nem mesmo minimizar a situação da maioria da sua população que vive em palafitas, favelas e periferias abandonadas. Parece que soa como normal às autoridades do Brasil que um monte de jovens envolvido com o crime seja assassinado diariamente. Essa situação não seria normal em outros países. Se houvesse educação competente, saneamento básico, moradia digna, transporte eficiente, emprego honesto e saúde de qualidade, certamente o Brasil nãos seria visto por outros países como país das bundas, em que jogadores de futebol de países vizinhos, de olho na copa do mundo, mandam recados para que as mulheres brasileiras estejam preparadas para a festa.



Muito próximo do Brasil localiza-se o Chile, um país onde a educação está colocada como pilar da sociedade. Ao visitar o Chile, a primeira coisa que o turista encontra é uma sociedade organizada, que não aceita ser oprimida pelos seus governantes, com polícias eficientes, trabalhadores recebendo salários dignos, ruas limpas. E olha que eles saíram de uma ditadura militar bem mais cruel do que a vivida pelo Brasil. Mas o que os diferenciou do Brasil ao longo da história é que eles não foram permissivos em demasia com o modelo de colonialismo cruel imposto à maioria dos países latinos. Brasil, Venezuela, Paraguai, Uruguai, Peru, entre outros, foram os países mais explorados e massacrados pelos colonizadores, colonização que, na mente dos líderes das nações poderosas, persiste até hoje. Somos, ainda, vistos como uma colônia a ser explorada. Permitimos isso.

Na esteira da tolerância e da permissividade, toleramos o político corrupto, o policial bandido e o assaltante e ladrão comum. Depois, com o tempo, passamos a permitir que eles façam parte das nossas vidas, aproveitamos a modernidade e passamos a assistir nas telas os noticiários informando as mortes no trânsito desorganizado, nas guerras do crime e nas filas dos hospitais. Viramos para o lado e fechamos os olhos como se logo ali uma formiga tivesse sido pisoteada.



Uma sociedade só será desenvolvida e justa quando o instinto de sobrevivência for coletivo, quando houver solidariedade e dignidade nas ações dos políticos. Pode-se tolerar, por certo tempo, a injustiça até que se encontre os meios para extirpá-la. Agora, permitir que ela faça parte das nossas vidas, aí já é o início do fim da civilização.

Texto de Pedro Paulo de Oliveira.


quarta-feira, 9 de outubro de 2013

SÍNDROME DE CAIM E ABEL. - A VIOLÊNCIA DO SER HUMANO.




O que nos diferencia dos outros animais que povoam a terra? pode ser que seja o nosso inconformismo com a vida. Enquanto os demais seres vivos buscam, apenas, um abrigo seguro e o alimento de cada dia, nós, seres humanos, estamos, sempre, em busca de algo maior, grandioso, sonhando como na estória de Ícaro, sonhando e subindo até que as nossas asas se derretem e caímos por terra.

Religiões e sistemas de governo, criados com o intuito de manipular esse inconformismo latente, permanecem vivos e as pessoas ainda acreditam que podem ser salvas por falsos profetas, políticos populistas e líderes mentirosos. Não há como fugir das manipulações de massa, implícitas nas propagandas dos produtos das grandes indústrias. Bebemos Coca-Cola porquê é moda, é bonito, coloca-nos no patamar dos grandes atletas e artistas que fazem a sua propaganda. Queremos nos parecer com os nossos ídolos. Por isso usamos determinadas roupas e perfumes específicos. A música que ouvimos nem sempre soa bem aos nossos ouvidos. No entanto, continuamos a ouvi-la e dançamos ao seu ritmo que nos foi imposto pela mídia. É assim que funciona: se uma determinada pessoa deseja ser artista e tem alguns milhares ou milhões para investir, não precisa ter talento. Especialistas em convencimento trabalharão para convencer as massas de que essa pessoa é um grande artista. O mesmo se dá com qualquer produto, seja de vestuário, seja de alimentação ou de locomoção.

Somo todos impulsionados pelo poder da imagem e do som, tal como os demais animais da natureza. Mas, tal como já foi dito, com a diferença de que somos inconformados com a realidade. Essa é a razão que nos leva a matar. Matamos nossos semelhantes por várias razões: por prazer, por raiva, por despeito, por vingança, por ganância, por sexo e pelo poder. Outras vezes matamos por desvios de personalidade, que carregamos desde a nossa concepção no útero, ou por traumas que sofremos em nossas vidas. Traumas criam monstros. Prenda um cachorro e o açoite todos os dias incitando-o a atacar outros cães. Em pouco tempo você criará uma fera cruel e mortal. É por essa razão que as prisões brasileiras, verdadeiras pocilgas, não reabilitam nenhum ser humano. Pelo contrário, criam monstros sedentos de sangue.

O instinto não conhece regras. Por essa razão, nasceram as primeiras guerras (disputa pelo poder); o acúmulo de riquezas (demonstração do poder, onde as hierarquias se expõem em vários níveis, e quem tem a riqueza vai sobrepujando quem tem menos até chegar a quem nada tem); a exposição da beleza física (a vaidade como poder – o corpo perfeito humilha o desconjuntado); a troca de parceiros sexuais (como quebra do padrão da fidelidade entre um homem e uma mulher, pois a fidelidade, como regra, é extremamente frustrante); e a evolução da ciência (como busca de meios para prolongar a vida e, ao mesmo tempo, ter nas mãos os meios para manipular semelhantes em todos os campos da sociedade).

O que diferencia as sociedades do oriente, com as suas ditaduras, do capitalismo do velho mundo europeu ou do novo mundo americano são as condições de vida dos seres humanos que vivem em cada região, pois os desejos de cada sociedade são idênticos e homens e mulheres são levados a viver segundo as convenções que não gostariam de respeitar e que, sempre, seus governantes não respeitam ( eles podem viver como nababos e em haréns) e formam nações que dividem as riquezas segundo o meio ambiente de cada lugar. As guerras surgem, então, pela disputa dessas riquezas.

Somos, sempre, impelidos pelo desejo constante de perpetuação das nossas riquezas, por menores que sejam e prazer de aniquilar outros seres humanos que, embora movidos por todos os sentimentos de inconformismo, são indefesos, por estarem numa escala inferior do poder.

Vence quem acumulou mais riquezas (conglomerados econômicos, indústrias de transformação, incluindo as de armamentos) e, através dessas riquezas, detêm meios eficientes para aniquilar sociedades inimigas.

Não haverá trégua para o ser humano, enquanto ele não compreender a sua condição limitada; não haverá plenitude para a vida enquanto homens e mulheres não aceitarem a sua condição limitada, pois eterno ainda é o universo, do qual pouco ou quase nada conhecemos e ao qual pertencemos como um todo.

Enquanto isso, cada ser humano certamente continuará sua peregrinação, prolongando sua existência, buscando o prazer e, escondido, quebrando as convenções criadas pelas religiões e governos.

Os jornais estampam as tragédias diárias das diversas comunidades espalhadas pelos diversos cantos da sociedade, onde os criminosos, implacáveis, formam grupos armados, amedrontam e assassinam sem piedade homens, mulheres e crianças. Algumas perguntas ficam no ar: por que os seres humanos se matam? Seria a síndrome de Caim e Abel (despeito, raiva)? Ou seria o simples prazer que alguns homens têm de matar seus semelhantes? Certamente a resposta está no âmago de cada um, na vontade de ente limitado que quer ser deus.

A humanidade sempre de digladiou e civilizações, em nome da justiça, de Deus e do poder foram dizimadas pelos impérios, cada qual na sua época e na sua forma: Egito, Grécia, romã, França, Inglaterra, Espanha, Portugal, Rússia(união soviética) e "Estados Unidos da América". Portanto, é pura demagogia afirmar que hoje a humanidade está pior do que a 3003 anos atrás. Hoje, existem mais seres humanos espalhados pela terra e os meios de comunicação nos transmitem, em tempo recorde, as notícias ocorridas do outro lado do mundo.

Não podemos simplesmente afirmar que as injustiças sociais são as principais causas da criminalidade. Existem mais bandidos nos altos escalões da sociedade do que no meio dos miseráveis espalhados nas periferias das cidades ou nos grotões das zonas rurais. A maioria dos verdadeiros bandidos controla o povo que vive sob a égide da lei, vigiado, oprimido e obrigado a consumir produtos que, na verdade, nem gostariam de ter.

O trabalhador, braçal ou intelectual é movido por códigos de éticas rígidos e foram eles que salvaram a humanidade das suas tragédias e, acredito, serão eles que salvarão o mundo num futuro próximo.

É possível acreditar que um empresário que polui um rio, ou devasta uma floresta, ou joga gases venenosos na atmosfera, ou empresta dinheiro para receber o dobro, ou que paga salários miseráveis tendo grandes lucros não é um bandido? A resposta poderá ser que o progresso tem o seu preço. Mas a própria palavra progresso não admite o desrespeito à vida, principalmente a vida do ser humano. E o político que aceita propina e recebe altos salários num país em que a maioria do povo vive na miséria?

Não é possível sonhar com um mundo perfeito, não nesta terra onde a ambição graça entre os seres humanos e usurpa os valores morais que, se não existissem, a humanidade já teria desaparecido. No entanto, os seres humanos continuarão, sempre, se matando em nome sabe-se lá de que, tal como vemos todos os dias nos noticiários: A mãe que mata a colega de trabalho da filha que reclamou que foi humilhada na empresa; o homem que assassina mãe e filhos, depois de não teve mais o seu amor correspondido; o assaltante que atira num jovem que sonhava ser juiz para roubar-lhe um par de tênis; e o jovem que é assassinado porquê reclamou da conta do restaurante.

Para que não restem dúvidas: o parágrafo acima se refere à sociedade brasileira, ao nosso país, afundado numa violência descomunal, só semelhante ou maior do que as violências dos países em estado de guerra ou terrorismo, na África e no Oriente Médio.



Texto de Pedro Paulo de Oliveira

Imagem: Google.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

LULA - O ETERNO PRESIDENTE DO BRASIL




A nossa sociedade tem passado por grandes transformações sociais e muitas dessas transformações se devem à era Lula. A entrada de Luiz Inácio Lula da Silva na política, a partir das greves dos trabalhadores do ABC, nos anos 80 do século XX, mudou radicalmente a cara do Brasil. Foi um tempo em que o comunismo começava a ruir no mundo e nascia, também, na Polônia o sindicato solidariedade.

Foi através do Sindicato Solidariedade que Lech Walesa, tal como Lula se destacou na liderança sindical, se promoveu e chegou à presidência da Polônia, logo após a queda do comunismo naquele país. No entanto, ele só conseguiu um mandato, não fez fez nenhuma reforma social relevante e saiu desmoralizado do poder.

Lula, após longas derrotas em eleições presidenciais, aprendeu que era preciso fazer acordos para se chegar ao poder. Fez, então, o que foi necessário: colocou seus soldados para alinhavarem os acordos e conseguiu se tornar presidente da maior economia da América Latina e uma das maiores do mundo. Logo que entrou no Palácio do Planalto, implantou um governo de acordos de bases, valorização dos "companheiros", negociação com o Congresso Nacional e apoio aos sindicatos e movimentos sociais. Lentamente o governo Lula foi aperfeiçoando as políticas sociais, com destaque para o Bolsa Família.

A reeleição de Lula foi uma babada. Aniquilou José Serra que, vaidoso e teimoso, nem percebeu que estava morto politicamente. Sabiamente Lula conduziu o processo político, mesmo diante de escândalos como os do Mensalão, que derrubaram José Dirceu e José Genoíno, alicerces políticos do seu governo. Nem assim a oposição conseguiu derrubá-lo.

Lula, então, para espanto de todos os políticos, na hora de lançar seu sucessor, retirou da manga uma candidata que havia nomeado recentemente para o lugar de José Dirceu como Chefe da Casa Civil e que havia sido, também, Ministra das Minas e Energia: Dilma Rousseff, filha de imigrantes, militante de esquerda nos tempos da Ditadura Militar e ex-guerrilheira. Era um risco que a maioria dos seus "Companheiros não queriam compartilhar. Ele encarou o risco, exigiu que ela fosse aprovada na convenção e, com ela, mais uma vez, aniquilou José Serra com o seu discurso neoliberal cansado.

A intenção de Lula ao lançar Dilma para presidente era se eternizar no poder. Ela, como sua fiel discípula e escudeira, nunca fugiu desse compromisso e a marca LULA continuou e continua presente no governo Dilma.

Nenhum outro presidente na história do Brasil conseguiu tanta popularidade e por tanto tempo. O carisma de lula ultrapassou e continua latente em todas as partes do mundo. Claro que muita gente neste país não gosta dele e dos seus "companheiros". Mas, isso é uma outra história. Lula se transformou num símbolo do Brasil, queiram ou não os seus desafetos. Lula é amado pela maioria do povo brasileiro - carente de heróis - e odiado por uma minoria que ainda se acha aristocrática.

O maior mérito de Lula seja, talvez, o de se parecer com o Brasil. Lula tem a cara do seu povo; tem o jeito de falar do brasileiro; tem o modo de andar do nordestino; tem o sorriso matreiro; e sorrio, parecendo inocente. O povo gosta disso.

Texto de Pedro Paulo de Oliveira.

Imagem: Google.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

MARINA SILVA – CANDIDATA A PRESIDENTE A QUALQUER CUSTO – A DECISÃO POR TRÁS DE UM GOLPE.




Todos nós sabemos que a ex-ministra Marina Silva é uma mulher determinada e que gosta dos holofotes e do poder. Ou então ela não estaria nesse embate – no momento inglório – para registrar o seu novo partido. Tentou de todas as formas, com apoio de parte da mídia e de empresas poderosas, como a Natura e o Banco Itau, registrar sua sigla à revelia da legislação vigente. Prevaleceu o que preconiza a lei e a justiça eleitoral não acatou seu pedido.

Marina silva quando lançou sua campanha em prol do seu novo partido, afirmou que assim o fazia por que no Brasil não havia nenhum partido sério. Sua intenção, no entanto, pelo que se comentava nos bastidores, era atingir o Presidente Lula. Entre os dois existe uma mágoa que virou ferida que não fecha. Marina, nos seus tempos de Ministra, almejou ser a preferida de Lula. Mas, ele não viu nela uma discípula. Viu que ela tinha certa independência política e não seguiria seus preceitos, tal como Dilma vem seguindo. Assim, Lula tentou aniquilar a mulher das florestas, filha de seringueiro e teimosa. Não adiantou. Ela ajudou a fundar o Partido Verde, com Fernando Gabeira, outra figura importante do cenário político nacional. Lançou-se candidata defendendo um “programa de governo verde”. Transformou-se em opção para os insatisfeitos com Lula e que não queriam votar no cansado discurso neoliberal de José Serra. Deu trabalho e acabou levando a eleição para o segundo turno. NO segundo turno, como estratégia política, não apoiou nenhum candidato.

Às vésperas de 2014, quando ocorrerão as eleições para o Congresso Nacional e Presidente do Brasil, bem como para governadores dos estados e assembleias legislativas, marina Silva ressurge. Sofreu uma derrota fragorosa no tribunal ao ver negado o pedido de registro do seu partido. E olha que ela daria trabalho na próxima eleição presidencial. Segundo os institutos de pesquisas ela está com mais de 16% das intenções de votos. É muito para um pré-candidato que nem partido ainda tem.

Se Marina Silva entra com o seu partido na disputa eleitoral do ano que vem, haveria grande possibilidade dela passar para o segundo turno e Aécio Neves ficar em terceiro lugar. Isso os tucanos não podiam admitir. Desta forma, Aécio e seus aliados, trabalharam nos bastidores, também, para que o Partido da Marina não desse certo. O mineiro, descendente de sangue da raposa política chamada Tancredo Neves, pensou que podia ter Marina como sua vice e logo que soube da decisão do Tribunal Eleitoral, estendeu-lhe o tapete vermelho. Mas, a ex-senadora e ex-ministra não iria queimar seu filme se unindo a um tucano investigado por má administração de recursos públicos enquanto governador de Minas Gerais, entre outras acusações. Preferiu se filiar ao PSB de Eduardo Campos, descendente de Miguel Arraes. Desta forma, ela pensa que poderá levar a eleição para o segundo turno; ofereceu-se para ser vice de Eduardo Campos na candidatura à presidência da república (mas com a esperança de que ele ceda-lhe a cabeça da chapa). Mesmo que ela não seja a cabeça da chapa e siga como vice, acredita que estará cumprindo sua missão de morder o calcanhar de Lula.

Texto de Pedro Paulo de Oliveira

NAYRA E O CHAVELHO DE ESPINHOS NA FAIXA DE GAZA

" Esses pequeninos, cheios de sonhos, sonhos que embalam o mundo, distantes das       ambições e da crueldade dos homens e mulheres que...