quarta-feira, 14 de maio de 2014

O QUE ESTÁ ACONTECENDO COM A HUMANIDADE DOS BRASILEIROS?


            Havia vida naqueles olhinhos, quatro brilhantes refletindo a luz do dia; havia esperança que os movia, esperança inocente, entre sorrisos, brincadeiras, abraços e o amor comum à infância. Então... Veio o homem sem esperança, sem brilho, sem amor... O homem não sorriu, entrou pela casa e encontrou os dois irmãos juntinhos, brincando, como sempre. A irmã mais velha, de treze anos se levantou assustada, olhou para o jovem forte, negro e carrancudo entrando pela sua casa sem ser convidado. Correu para junto do irmão mais novo, de nove anos, abraçou-o e perguntou:

“O que você quer?”

“Esqueci uma coisa minha aqui e vim buscar” - Respondeu o homem, secamente.

                Aquele homem havia estado mais cedo na casa para receber uma dívida de R$140,00 do irmão mais velho das duas crianças. Como ele só recebeu R$100,00, resolveu voltar para receber o restante de outra forma.  

Ao vê-lo na sala, olhando em todas as direções, a criança de nove anos disse:

 “Não tem mais ninguém em casa... Vá embora, por favor.”

“fiquem quietos. – Ordenou o homem. Vim receber o resto da minha dívida e vou levar o notebook como pagamento."

                A súplica daquela criança passou como uma rajada de vento nos ouvidos do jovem e, assustadas, começaram a gritar. O homem se aproximou delas e as esbofeteou com violência. Sentiu um prazer quase que absoluto em bater-lhes. Os dois irmãos caíram no chão e o homem arrasto-os para quartos separados. Amarrou a garota com o fio de um carregador de celular e o garoto com um lençol. Depois, foi até a sala, apanhou o notebook, dois celulares e um tablete. A garota, no entanto, conseguiu escapar. Ao perceber que ela tentava fugir, acertou-a com um soco e tornou a amarra-la com o fio do carregador de celular. Só que desta vez, deu um nó no fio envolto no pescoço dela.

                Na mente daquele homem não bastava apenas levar os objetos, era preciso se vingar do irmão delas. Foi até os quartos com uma garrafa de álcool nas mãos e olhou-as. A menina mais entendeu o que se passava e suplicou:

“Não nos mate, moço, não faça mal pra gente.”

                Surdo por um desejo de vingança incontrolável, na mente daquele jovem forte, de 21 anos, perpassava a imagem do irmão mais velho daquelas duas pequenas vidas. Queria se vingar dele e deixaria sua marca naquela casa, da forma mais perversa possível. O irmão dos dois inocentes lhe devia e não pagou. Pagaria de outra forma.

                As duas crianças, que há poucos instantes sorriam em seus folguedos, vislumbraram a crueldade plena na face do carrasco que acendeu o isqueiro calmamente. O brilho nos olhos daquele homem era opaco, assustador. A menina entendeu o tamanho da crueldade que estava acontecendo contra si e seu irmão. Entendeu que chama que ardia na mão do jovem de 21 anos, terminaria com os seus sonhos e com os sonhos do seu irmão. Só não entendeu a razão pela qual estava terminando sua passagem pela terra de forma tão dramática e cruel. Queria até perguntar para o homem por que ele estava fazendo aquilo. Será que não bastava levar todos os objetos eletrônicos da casa? Mas, ela estava engasgada pelo medo. Nada havia a fazer. Fechou os olhos e gritou o quanto pode quando as chamas começaram a consumir seu corpo. Ouviu os gritos do irmão no outro quarto, pedindo por socorro e foi tudo mais o que ainda pode ouvir. Quis poder estar ao lado dele e abraça-lo.

                O homem mal se virou calmamente e seguiu na direção da sua casa, onde guardou o  que havia roubado. Depois, foi para a casa da namorada do outro lado cidade. Ela, ao vê-lo, abraçou e lhe disse:

“Você tá fedendo queimado. Que cheiro danado de fumaça!”

                Ele olhou para a namorada, sorriu e respondeu:

“Tou mesmo... Queimei uns bichinhos lá em Ceilândia pra servir de exemplo pra outro bicho.”

                Tomei por base para esta narrativa, o assassinato de duas crianças no último dia 12 de maio em Ceilândia, cidade Satélite de Brasília, no Distrito Federal. Não citei o nome do assassino por entender que ele não merece ter seu nome citado. Com mais essas mortes eu pergunto o que está acontecendo pelas periferias do Brasil? Uma mulher é assassinada por ter sido confundida com uma sequestradora; outra mulher foi torturada e morta por ter furtado um pacotinho de bolacha; um garoto é morto por que era um empecilho na vida de uma madrasta; um homem foi quase linchado por ser irmão de um suposto pedófilo; e duas crianças são queimadas vivas por que eram irmãos de um homem que devia R$140,00 para um psicopata. Isso tudo sem contar a quantidade de moleques armados, assassinos impiedosos praticando assaltos pelas ruas das cidades do Brasil.

                A população não confia na polícia, não confia na justiça, não confia nos políticos, não confia na saúde e está aterrorizada quando sai de casa, com medo das greves nas empresas de ônibus e metrôs. Isso é uma merda. Sim, isso mesmo, como disse o bêbado subindo a avenida da minha cidade: “merda pura esse negócio todo.”

                Por que a população não confia na polícia? Por que a população não confia na justiça? Por que a população não confia nos políticos? Por que a população não confia no transporte público? Por que a população não confia no sistema de saúde? Todo mundo sabe por quê. Boa parte das polícias está corrompida, com bandidos nas suas fileiras; a nossa justiça é a mais lenta do mundo, além de privilegiar quem tem dinheiro; a maior parte dos políticos é corrupta e ou defende interesses pessoais; O nosso transporte público é um dos mais caro do mundo e com a pior qualidade; e o nosso sistema de saúde está falido.

                Talvez a resposta para o caos que está se instalando no meio das classes menos favorecidas do Brasil esteja na falência das suas instituições, como explicitado acima. Uma nação onde a justiça falha em demasia, tende a rumar para a desordem.



Texto integral de Pedro Paulo de Oliveira.
               



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